Recentemente li o livro “Futebol de rua: um beco com saída”, de Hélder Fonseca e Júlio Garganta, sobre um tema que acho bastante interessante: o futebol de rua. É um livro que resulta de um trabalho académico (tese de monografia do primeiro autor) e que procurou entender a importância desta prática informal e espontânea na formação de habilidades e competências específicas da modalidade. Para isso, foram entrevistados jogadores ou ex-jogadores de elite, treinadores e especialistas académicos nas áreas da metodologia do treino e da psicologia do desporto.
Os autores concluíram que o futebol de rua, ou os pressupostos que o rodeiam, devem ser potenciados ou explorados, no intuito de induzir a aquisição/aperfeiçoamento de habilidades motoras, cognitivas e sociais que dificilmente podem ser estimuladas em contextos mais rígidos e controlados, como nos clubes ou nas escolas de futebol. O jogar na rua permite que a criança/jovem explore as soluções mais adequadas às circunstâncias contextuais sem imposições exteriores e sob uma base de motivação intrínseca assinalável. No treino desportivo, essencialmente com jovens, é muito frequente assistirmos os treinadores a tomarem decisões pelos praticantes, não possibilitando que os aprendizes leiam o jogo, eventualmente errando, para desenvolver e consolidar a sua autonomia decisional.
Neste particular, Duarte Araújo salienta a relevância e complementaridade de dois conceitos no ensino/treino do jogo de futebol: a descoberta guiada, em que se guia os praticantes para chegar a uma determinada referência e o ensino divergente, em que se coloca os praticantes a explorar soluções para alcançar um ou mais objetivos, soluções essas possivelmente desconhecidas pelo próprio treinador. Não há apenas um caminho que se pode percorrer para almejar o êxito; a diversidade de boas práticas (pelos praticantes e pelos treinadores) parece consubstanciar um potencial enorme para, de acordo com a tríade praticante-tarefa-ambiente, estabelecer interações positivas no sentido da manifestação e refinamento do talento inato.
Encarado como uma excelente forma de prática do jogo em idades mais tenras, o futebol de rua é um desígnio comum da esmagadora maioria dos jogadores reconhecidos a nível mundial. Os próprios destacam a importância da quantidade de horas passadas a jogar à bola na rua durante a sua infância e juventude, muitas das vezes em situações contextuais adversas (e.g., pisos irregulares, bolas furadas, bolas duras, paredes laterais, inexistência de coletes, etc.), mas que estimularam, de sobremaneira, o desenvolvimento de habilidades específicas, como a receção, o passe, a desmarcação e a capacidade de leitura do jogo.
Não é por acaso que o futebol de rua é um tema em voga, assente em inúmeras preocupações sobre o seu possível desaparecimento. Merece uma reflexão séria por parte daqueles que gostam do jogo e, sobretudo, daqueles que gostam de ensinar a jogar, porque de um beco há-de sempre haver, no mínimo, uma saída.
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