A curiosidade e o
futebol, em desfavor de qualquer tipo de pressão ou incentivo, sempre fizeram
parte da minha vida. Contudo, não vivo nem da curiosidade nem do futebol. Um
dia destes achei piada a um fenómeno designado nos meandros das ciências do
desporto de «home advantage». Em suma, trata-se da capacidade de uma equipa conquistar
mais de 50% dos seus pontos finais no seu reduto (em casa), quando disputadas competições
com calendários equilibrados, isto é, com o mesmo número de jogos nas condições
de visitado e visitante, perante as mesmas equipas adversárias.
Os efeitos do «home
advantage» têm sido comprovados em diversos jogos desportivos coletivos,
incluindo o futebol, o futsal, o andebol, o basquetebol, o râguebi, o voleibol,
etc. No entanto, apesar das múltiplas evidências recolhidas ao longo das
últimas décadas, pouco se investiu em tentar perceber (1) quais as diferenças (e
se, de facto, existem) entre diferentes níveis competitivos e (2) as tendências
temporais do fenómeno numa ou mais modalidades, num determinado país. Por
razões óbvias, a nossa escolha recaiu sobre Portugal. Ontem, no dia em que se
comemorou o primeiro aniversário da conquista do Campeonato Europeu de Futebol
pela nossa seleção, o produto final foi publicado no número 3 do volume 17 da
revista científica britânica International
Journal of Performance Analysis in Sport, agora sob a chancela da editora
multinacional Routledge. Um acaso feliz. Este artigo contou com a inestimável colaboração
da prof. Anna Volossovitch do SpertLab da Faculdade de Motricidade
Humana, Universidade de Lisboa (figura 1).
Figura 1.
Cabeçalho, título e autores do artigo.
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A amostra incluiu 32.400
jogos disputados em três níveis competitivos desde a época 2005/2006 até à
época 2015/16, perfazendo um total de 11 épocas desportivas. Os níveis competitivos
definidos foram os seguintes:
· Profissional – Campeonato da I Liga;
· Semiprofissional – Fases regulares da 2ª Divisão B, Campeonato Nacional
de Seniores e Campeonato de Portugal Prio;
· Amador – principais campeonatos de 9 associações distrital de
futebol de Portugal continental (Algarve, Beja, Évora, Castelo Branco, Coimbra,
Lisboa, Guarda, Porto e Vila Real).
O efeito «home
advantage» (>50%) foi observado em todos os níveis competitivos, obtendo-se
os seguintes valores médios: profissional – 58.31%; semiprofissional – 60.46%;
amador – 60.36%. O nível competitivo influenciou significativamente a vantagem
de jogar em casa, sendo o valor médio do nível profissional significativamente
inferior aos valores médios dos níveis semiprofissional e amador. Entre estes
últimos a diferença não obteve significado estatístico. A figura 2 mostra as
tendências temporais, a médio prazo, do «home advantage» nos três níveis
competitivo do futebol português.
Figura 2. As
tendências temporais do «home advantage» na última década do futebol português.
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A médio prazo, foi
possível comprovar um decréscimo significativo do efeito de jogar em casa no
futebol português. Contudo, quando analisados os níveis competitivos
isoladamente, verificou que as correlações lineares negativas apenas foram
significativas nos níveis semiprofissional e amador. No nível profissional, não
obstante o declínio da «home advantage» previamente evidenciado por Marques
(2009), demonstrou-se que, nos anos mais recentes, tem havido uma estabilização
dos valores médios em torno dos 56-59%. Muito genericamente, e reportando-nos exclusivamente
à última década, concluímos que a vantagem de jogar em casa tem perdido
importância no futebol português. Aos demais interessados sobre a temática, esta
curtíssima síntese do artigo não dispensa a leitura integral do mesmo. Aqui vos
deixo mais alguns detalhes originais do nosso trabalho:
Abstract
This study aimed to examine
the influence of level of competition (amateur, semi-professional and professional)
on the magnitude of home advantage (HA) in Portuguese football, and to verify
whether the HA has changed over time. Archival data from 32,400 matches
contested in the three levels of competition over 11 seasons (from 2005/2006 to
2015/2016) were analysed. HA was quantified each season for each league as the
number of points won at home expressed as a percentage of all points won at
home and away. The mean values of HA were significantly greater than 50% in all
levels of Portuguese football (p < 0.001). One-way repeated-measures ANOVA
showed a significant effect of competitive level on HA (p < 0.05). In the
professional league, the HA was significantly lower (58.31%) than in amateur
and semi-professional competitive levels (60.36% and 60.46%, respectively).
Altogether, a declining HA effect was found in Portuguese football in recent
years. However, negative linear relationships between HA and time were only
significant at amateur and semi-professional levels (p < 0.05), while the
decline in the major professional league has already started to level off.
These findings demonstrate that the advantage of playing at home is losing
importance in Portugal. The declining effect of HA, previously evidenced in
major professional leagues, has been mirrored by a similar decline at amateur
and semi-professional levels within the country. Future
research should confirm whether the trends identified in Portugal are also
verified in football leagues of other countries.
Keywords:
home advantage, match location, expertise, temporal changes, soccer.
Reference
Almeida, C. H., & Volossovitch, A. (2017). Home advantage
in Portuguese football: Effects of competitive level and mid-term trends. International Journal of Performance
Analysis in Sport, 17(3), 244-255. (link)
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