Nota prévia: O artigo
científico alvo da presente síntese foi selecionado em função dos seguintes
critérios: (1) publicado numa revista científica internacional com
revisão de pares; (2) publicado no último trimestre; (3)
associado a um tema que considere pertinente no âmbito das Ciências do
Desporto.
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Autores: Casamichana, D., Barba, E., Aguirre, G., Agirrezabalaga,
O., & Castellano, J.
País: Espanha
Data de publicação: 4-novembro-2024
Título: Compensatory training
sessions, do they really compensate?
Referência: Casamichana, D., Barba, E., Aguirre, G., Agirrezabalaga, O., & Castellano, J. (2024). Compensatory training sessions, do they really compensate? International Journal of Sports Science & Coaching, 1–7. Advance online publication. https://doi.org/10.1177/17479541241287914
Figura 1. Informações editoriais do artigo do mês 59 – novembro de
2024.
Apresentação do problema
O conhecimento sobre as cargas externas no microciclo competitivo tem evoluído significativamente. Os estudos mostram que os jogos oficiais representam a maior parte da carga semanal, diferenciando-se claramente das sessões de treino (Kelly et al., 2020; Stevens et al., 2017). Os jogadores com menos minutos acumulam menor atividade semanal, especialmente em ações de alta velocidade e sprint, com maior impacto em semanas de alta densidade competitiva (Casamichana et al., 2022; Gualtieri et al., 2020). Assim, encontrar formas de estimular jogadores com baixa participação nos jogos oficiais tornou-se uma preocupação central para treinadores e investigadores.
A investigação científica tem analisado as cargas externas no treino compensatório do microciclo (MD+1, ou seja, treino após o dia de jogo) para jogadores com menos minutos em competição. Martín-García et al. (2021) observaram que estas sessões atingem mais de 50% da carga do jogo em variáveis como a distância total percorrida, a potência metabólica média e as acelerações/desacelerações (>3 m/s2), mas apenas 20% na distância em alta velocidade (>19,8 km/h) e em sprint (>25,2 km/h). Calderón-Pellegrino et al. (2022) destacaram que estas sessões não replicam as exigências dos titulares, sobretudo na distância em sprint (>24,0 km/h).
A comparação das cargas externas entre diferentes equipas dentro de uma estrutura profissional de futebol tem despertado interesse na literatura científica, mediante a análise das cargas acumuladas em sessões e microciclos por diferentes equipas (Calderón-Pellegrino et al., 2022; Martin-Garcia et al., 2018). Assim, Kavanagh et al. (2024) observaram recentemente que a carga externa semanal acumulada foi maior em semanas com 1 jogo na equipa principal em comparação com a equipa de reservas. Por outro lado, Houtmeyers et al. (2021) descreveram que, enquanto as cargas semanais a baixa velocidade foram mais elevadas nos jogadores de elite jovens, a intensidade e a variabilidade de carga tendem a aumentar quando esses jogadores transitam para o futebol profissional. A compreensão destas dinâmicas da carga externa pode favorecer a progressão dos jogadores entre equipas e facilitar a sua integração nos treinos de outras equipas do mesmo clube.
Contudo, existe pouca informação sobre a atividade
realizada pelos jogadores neste tipo de sessão (MD+1; Figura 2) e ainda menos
sobre os padrões de carga entre diferentes equipas no seio do mesmo clube de
futebol. Posto isto, o objetivo deste estudo foi comparar a carga externa
acumulada por jogadores pertencentes a 3 equipas do mesmo clube profissional na
sessão de treino compensatório, expressando-a tanto em valores absolutos como
em valores relativos às exigências do jogo.
Figura 2. Proposta de treino compensatório (fonte: https://isspf.com;
imagem não publicada pelos autores).
Métodos
Abordagem experimental: foram analisados 191 registos de sessões compensatórias realizadas por 3 equipas de um clube profissional na época 2019/2020. Estas sessões, executadas no dia seguinte aos jogos oficiais (MD+1), foram desenhadas para simular as exigências competitivas. Somente participaram os jogadores de campo que não foram titulares ou jogaram menos de 60 minutos no encontro anterior, com o objetivo de replicar, de forma aproximada, as cargas físicas do jogo.
Participantes: 51 jogadores de 3 equipas de um clube profissional: equipa principal (PRO, n = 16; 24,5 ± 3,5 anos; 180,6 ± 6,7 cm; 75,1 ± 5,7 kg), equipa de reservas (RES, n = 15; 21,3 ± 1,1 anos; 179,5 ± 7,1 cm; 72,5 ± 6,4 kg) e segunda equipa de reservas (RES2, n = 20; 19,7 ± 0,9 anos; 177,9 ± 5,1 cm; 70,7 ± 6,3 kg). Os guarda-redes foram excluídos devido à especificidade da posição. A equipa PRO competiu na primeira divisão espanhola (La Liga), a RES na terceira divisão e a RES2 na quarta divisão. Os dados foram recolhidos no âmbito da avaliação diária como condição de trabalho dos jogadores.
Variáveis: as sessões de treino compensatório foram monitorizadas com dispositivos MEMS, analisando-se 10 variáveis: duração total (min), distância total percorrida (TD, m), distâncias percorridas a velocidades moderada (TD14: >14 km/h), alta (TD18: >18 km/h), muito alta (TD21: >21 km/h) e sprint (TD24: >24 km/h), carga de aceleração (aLoad, AU), número de acelerações (>2 m/s²) e desacelerações (<-2 m/s²), e carga do jogador (Player Load – PL, AU). As variáveis foram obtidas via GPS e acelerómetros, seguindo limiares de intensidade de estudos prévios (e.g., Guridi Lopategui et al., 2021). A variável aLoad soma todas as acelerações e desacelerações positivas, refletindo as exigências totais de aceleração, independentemente da velocidade. A PL combina acelerações nos 3 planos de movimento, sendo fiável e validada para monitorizar a carga em jogadores de futebol (Casamichana et al., 2013).
Procedimentos: a investigação foi executada na primeira metade da época 2019/2020. As 189 sessões de treino compensatório analisadas ficaram assim distribuídas pelas 3 equipas: PRO = 80, RES = 52 e RES2 = 57. Estas sessões foram realizadas no dia seguinte ao jogo oficial, envolvendo jogadores que jogaram menos de 60 minutos. A carga externa foi monitorizada com dispositivos MEMS (Vector S7 e X7), e os dados, processados no software Catapult OpenField, garantiram elevada precisão. Para comparar com a carga dos jogos, estimaram-se os valores para os jogadores que não completaram as partidas: menos de 70 minutos baseados na média da posição e mais de 70 minutos extrapolados para 94 minutos. As cargas foram expressas em valores absolutos e relativos (%) em relação à média dos jogos oficiais.
Análise estatística: os
dados foram apresentados através de média, desvio padrão e intervalo (mínimo e
máximo), em valores absolutos e relativos (em relação ao jogo). As diferenças
entre as equipas foram avaliadas através de ANOVA de uma via. Também foram
calculadas as dimensões de efeito mediante o d de Cohen, considerando os
intervalos seguintes: trivial <0,2; pequeno >0,2; moderado >0,6;
grande >1,2; e muito grande >2,0 (Hopkins et al., 2009). As análises
estatísticas foram realizadas no software JASP, versão 0.18.1 para Windows, adotando-se
um nível de significância de p < 0,05.
Principais resultados
Os dias compensatórios
apresentaram diferenças significativas entre as equipas (PRO, RES e RES2) em
diversas variáveis de carga externa. As principais observações incluem:
1. Duração (DUR): as equipes RES e RES2 apresentaram
maior duração média de treino em comparação à PRO, com diferenças
estatisticamente significativas;
2. Cargas absolutas (PL e aLoad): os valores de
carga absoluta (PL) e carga acumulada (aLoad) foram significativamente maiores
para as equipas RES e RES2 em relação à PRO;
3. Distâncias totais (TD e respetivos patamares de
velocidade): a equipa RES percorreu as maiores distâncias totais (TD) e em
velocidades altas (TD14 e TD18), enquanto a equipa PRO apresentou valores
significativamente inferiores;
4. Acelerações e desacelerações (ACC e DEC): houve
um número mais reduzido de desacelerações (DEC) nas equipas RES e RES2 em
comparação à PRO, indicando padrões distintos de trabalho de intensidade entre os
conjuntos;
5. Diferenças não significativas: algumas variáveis,
como TD21, não apresentaram diferenças significativas entre as equipas.
· Magnitude das
diferenças entre as equipas para cada variável de carga externa
Os tamanhos do efeito das
diferenças entre as equipas para cada uma das variáveis de treino relacionadas
com os jogos demonstraram magnitudes mais pronunciadas nas variáveis associadas
ao volume (DUR%, PL%, aLoad% e TD%), com a equipa PRO a apresentar
consistentemente os valores mais baixos.
· Valores relativos (%)
da carga de treino compensatório em relação à carga do jogo oficial para cada
equipa.
Figure 3. Médias e desvios padrão das variáveis relativas (%) em
relação à carga de treino em dias compensatórios para cada equipa. Nota: DUR%
refere-se à duração total, aLoad% é a carga total de aceleração, PL% é a carga
do jogador, TD% é a distância total percorrida, TD14% é a distância percorrida
a >14 km/h, TD18% é a distância percorrida a >18 km/h, TD21% é a
distância percorrida a >21 km/h, TD24% é a distância percorrida a >24 km/h,
e ACC% e DEC% referem-se ao número de acelerações (>2 m/s2) e
desacelerações (<-2 m/s2), todas as variáveis relativas ao jogo.
PRO corresponde à equipa profissional, RES à equipa de reservas e RES2 à
segunda equipa de reservas. (a) indica >PRO, (b) indica >RES e (c) indica
>RES2 com p < 0,05.
Nas variáveis DUR%, PL%,
TD% e TD14%, foram encontradas diferenças significativas entre todas as
equipas. Além disso, na variável ACCLoad%, as equipas RES e RES2 exibiram
percentagens superiores à PRO. Para a variável TD18%, a equipa RES apresentou
valores relativos superiores à RES2, que, por sua vez, exibiu valores
superiores à PRO. As equipas RES e RES2 também apresentaram valores superiores
à PRO na variável ACC%. Por fim, na variável DEC%, a equipa PRO demonstrou
percentagens significativamente superiores à RES.
Aplicações práticas
A partir dos resultados obtidos, identificaram-se 3 aplicações práticas propícias para auxiliar os treinadores na otimização do treino compensatório, particularmente destinado a jogadores com menos minutos de competição. Estas recomendações concentram-se em estratégias para melhorar a condição física, equilibrar as cargas neuromusculares e garantir uma preparação mais consentânea com as exigências competitivas.
1. Estimular níveis competitivos em jogadores menos utilizados: as variáveis de carga externa oscilaram entre 30–90% do observado em competição, situando-se maioritariamente entre 50–60% das exigências do jogo oficial, enquanto valores mais altos foram registados nas ações de aceleração e desaceleração. Para preparar jogadores menos utilizados, os treinadores devem integrar jogos particulares ou simulados, especialmente em equipas de reserva ou formação, onde há maior disponibilidade de jogadores.
2. Estratégias eficientes para o treino compensatório: os jogos reduzidos/condicionados sobrecarregam a dimensão neuromuscular e subestimam aspetos como o pico de velocidade. Assim, o treino intervalado de sprint e de resistência de velocidade deve ser implementado para maximizar a condição física em cenários com menos jogadores ou tempo limitado. A exposição semanal à corrida de alta velocidade, como sprints, pode melhorar o desempenho e reduzir a incidência de lesões, sendo uma estratégia essencial para os jogadores pouco utilizados.
3. Corrigir o desequilíbrio entre ações de aceleração e
desaceleração em treinos compensatórios: as sessões de treino compensatório
apresentaram uma maior frequência de acelerações em comparação com as desacelerações,
tanto em número absoluto como em percentagem das exigências competitivas. Este
desequilíbrio pode limitar o desenvolvimento equilibrado das capacidades
neuromusculares dos jogadores. Assim, além da utilização de jogos reduzidos/condicionados
para estimular acelerações, é essencial integrar exercícios como corrida
intervalada com mudanças bruscas de direção e desacelerações progressivas após
sprints, por forma a garantir uma preparação mais completa e alinhada com as exigências
do jogo.
Conclusão
Este estudo comparou as cargas externas acumuladas em
sessões de treino compensatório de 3 equipas de um clube profissional de
futebol. As equipas de reserva apresentaram cargas absolutas e relativas
superiores à equipa principal, com destaque para ações de aceleração e
desaceleração. Contudo, observou-se um desequilíbrio entre acelerações e desacelerações,
bem como uma sub-representação de ações em alta velocidade e sprint em relação
às exigências do jogo oficial. Estes resultados sugerem que os treinos
compensatórios devem ser ajustados para replicar mais fielmente as condições de
competição, integrando exercícios de sprint e mudanças de direção. A aplicação
prática destas evidências poderá melhorar a preparação de jogadores com menos
minutos e reduzir o risco de lesões em contexto competitivo.
P.S.:
1- As ideias que constam neste texto foram originalmente
escritas pelos autores do artigo e, presentemente, traduzidas para a língua
portuguesa;
2- Para melhor compreender as ideias acima referidas,
recomenda-se a leitura integral do artigo em questão;
3- As citações efetuadas nesta rubrica foram utilizadas pelos
autores do artigo, podendo o leitor encontrar as devidas referências na versão
original publicada na revista International Journal of Sports Science &
Coaching.
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