Nota prévia: O artigo
científico alvo da presente síntese foi selecionado em função dos seguintes
critérios: (1) publicado numa revista científica internacional com
revisão de pares; (2) publicado no último trimestre; (3)
associado a um tema que considere pertinente no âmbito das Ciências do
Desporto.
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Autores: Lago-Peñas,
C., Kalén, A., Lorenzo-Martinez, M., López-Del Campo, R., Resta, R., & Rey,
E.
País: Espanha
Data de publicação: 22-dezembro-2020
Título: Do elite players cover longer
distance when losing? Differences between attackers and defenders
Revista: International Journal of
Sports Science & Coaching
Referência: Lago-Peñas, C., Kalén, A., Lorenzo-Martinez, M., López-Del Campo, R., Resta, R., & Rey, E. (2020). Do elite players cover longer distance when losing? Differences between attackers and defenders. International Journal of Sports Science & Coaching. https://doi.org/10.1177/1747954120982270
Figura 1. Informações editoriais do artigo do mês 13 – janeiro de
2021.
Apresentação do problema
No futebol, as evidências sobre a análise do deslocamento na unidade de tempo (“time-motion analysis”) são úteis para quantificar a performance de corrida em jogo e podem fornecer orientações claras para o desenvolvimento de (1) testes específicos para a avaliação do desempenho e (2) regimes de treino (Bradley et al., 2009). Adicionalmente, estudos prévios têm demonstrado que variáveis situacionais, como o resultado corrente do jogo (a vencer, empatado ou a perder), a localização do jogo (casa ou fora), o nível da oposição (e.g., forte ou fraca) e a parte do jogo (primeira ou segunda) influenciam o perfil de corrida dos jogadores (Paul et al., 2015).
No que se refere ao resultado corrente do jogo, a tendência é verificar-se um aumento da corrida em alta velocidade quando as equipas estão a perder, comparativamente à situação de vantagem no marcador. Por exemplo, Lago-Peñas et al. (2010) mostraram que, por cada minuto a perder, os jogadores percorreram um metro extra em sprint (>19 km/h), em relação a quando estavam a ganhar; inversamente, na liderança do marcador, aumentaram os deslocamentos a baixa velocidade (<11 km/h). Contudo, ao equacionarem o resultado parcial do jogo, em períodos de 15 minutos ou em cada parte, Moalla et al. (2019) observaram que os jogadores correram maiores distâncias em todas as intensidades de corrida quando estavam a vencer. Outros estudos evidenciaram que jogadores de elite, independentemente do resultado corrente do jogo, percorrem distâncias similares em corrida de alta intensidade (Bradley & Noakes, 2012; Redwood-Brown et al., 2012). Estes factos contraditórios podem dever-se a diversas limitações do foro metodológico.
Embora poucas investigações tenham examinado o efeito da posição de jogo no perfil de corrida durante vários resultados correntes, foram reportados dados igualmente divergentes. Redwood-Brown et al. (2012) desvendaram que os médios percorrem maiores distâncias em corrida de alta velocidade quando empatados, os defensores quando estão a perder e os atacantes quando estão em vantagem (figura 2). Mais recentemente, Redwood-Brown et al. (2018) não constataram a existência de qualquer diferença entre as posições de jogo nos deslocamentos de alta intensidade ou em sprint.
Figura 2. O avançado argentino Messi a correr com bola, diante do
CD Leganés, época 2017/2018.
(imagem não publicada pelos autores; fonte:
zimbio.com)
Portanto, persiste a necessidade de investigar a
influência das posições de jogo nos deslocamentos em corrida no decurso das
partidas, tendo em consideração os resultados temporários possíveis. No sentido
de providenciar informação mais precisa sobre as demandas físicas em
competição, os autores não só ponderaram o tempo efetivo de jogo, em vez do
tempo total, como propuseram categorias mais abrangentes para a variável posição
de jogo (i.e., defesas centrais, defesas laterais, médios centro, médios
ala e avançados). O propósito do estudo foi averiguar a influência das
variáveis resultado corrente do jogo (“match status”) e posição de
jogo (“positional role”) nos perfis de corrida de uma vasta amostra de
jogadores de futebol de elite.
Métodos
Amostra: consistiu
em 4240 observações de jogo (412 jogadores e 297 jogos), da primeira divisão
espanhola – LaLiga –, na época 2018/2019. Apenas foram consideradas observações
de jogadores de campo que disputaram jogos completos. Partidas que envolveram a
expulsão de um ou mais jogadores (cartão vermelho) foram excluídas da amostra (n
= 73). Os dados foram obtidos da Liga de Futebol Profissional de Espanha
(LaLiga), que autorizou a utilização das variáveis incluídas nesta
investigação.
Procedimentos: o
sistema computorizado de rastreamento ótico TRACAB (ChryronHego VID, New York,
USA), com uma frequência amostral de 25 Hz, foi utilizado para captar a
performance de corrida em jogo. O desempenho físico foi avaliado através de seis
variáveis: (1) distância total percorrida, (2) distância de corrida em
velocidade lenta (low-speed running: LSR, 0–14 km/h), (3) distância de
corrida em velocidade média (medium-speed running: MSR, 14–21 km/h); (4)
distância de corrida em velocidade alta (high-speed running: HSR, >21
Km/h); (5) distância de corrida em velocidade muito alta (very high-speed
running: VHSR, 21–24 Km/h); (6) distância em sprint (>24 km/h). As
variáveis independentes propostas pelos autores constam na tabela 1.
Tabela 1. Definição
e categorias das variáveis independentes (situacionais) propostas no estudo
(tabela não publicada pelos autores).
Análise estatística: a
estatística descritiva foi reportada através de médias, desvios-padrão e
coeficientes de variação em percentagem para cada posição e localização de
jogo. O índice de vitória foi apresentado através de medianas e amplitudes
interquartis. Um modelo liner multivariado foi calculado para as variáveis
dependentes (performance de corrida em jogo), incluindo as variáveis
situacionais índice de vitória, localização do jogo, qualidade
da equipa, tempo efetivo de jogo e posição de jogo como
fatores principais fixos. As interações do índice de vitória com as
outras variáveis independentes também foram testadas. Os jogadores e as equipas
foram introduzidos como fatores aleatórios. Todas as análises foram executadas
no programa R, versão 4.0.0. O nível de significância foi estabelecido
para p ≤ 0.05 e foram utilizados intervalos de confiança de 95%.
Principais resultados
· Resultado
corrente do jogo
Figura 3. Diferenças na distância total percorrida e em cada
categoria de velocidade, em função do índice de vitória, para cada posição de
jogo (Lago-Peñas et al., 2020).
·
Localização do jogo
A jogar em casa, os jogadores percorreram maiores
distâncias de corrida em velocidades mais elevadas (alta, muito alta e sprint),
comparativamente a jogar fora. A interação desta variável situacional com o
índice de vitória revelou que as distâncias de corrida em velocidades alta e
muito alta tendem a aumentar quando a equipa visitada está em vantagem no
marcador durante mais tempo, observando-se um decréscimo mais pronunciado na
distância percorrida em velocidades baixas (<14 km/h).
·
Qualidade da equipa (diferença classificativa)
Uma diferença de ranking
positiva, i.e., uma equipa mais bem classificada do que a equipa adversária,
esteve relacionada com o aumento das distâncias total e percorridas em
velocidades média e muito alta. Ainda assim, quando equipas mais bem
classificas estão a vencer, há a tendência para não somente percorrerem maior
distância em baixa velocidade, como também para percorrer menos metros em
corrida de alta velocidade e em sprint.
· Tempo
efetivo de jogo
Em jogos com mais tempo
útil de jogo, os jogadores percorreram maiores distâncias de corrida total e em
velocidades baixa, média e muito alta. Quando ponderados o índice de vitória, a
diferença de ranking, a localização de jogo e a posição de jogo, não houve, no
entanto, acréscimo nas distâncias de corrida em velocidade alta e em sprint.
Aplicações práticas
Ao entender as demandas físicas do jogo, em função de variáveis situacionais, os treinadores poderão antecipar cenários que irão encontrar ao longo da competição e, assim, preparar mais convenientemente os jogadores e a equipa ao longo do microciclo. Na LaLiga – principal competição de clubes em Espanha –, os médios centro percorreram maiores distâncias totais que os jogadores de outras posições, possivelmente devido ao seu papel permanente de ligação intersetorial. Os defesas centrais e os médios centro percorreram menores distâncias de corrida em alta intensidade, em relação aos laterais, médios ala (extremos) e avançados.
Apesar disso, em situação de desvantagem no marcador, os defensores (centrais e laterais) tendem a aumentar as distâncias percorridas em velocidades média, alta, muito alta e sprint, provavelmente para fechar os espaços que são concedidos pelas equipas que estão a tentar assumir o jogo para anular a vantagem adversária. Ao invés, os médios ala e os avançados, em contextos de vantagem no marcador, tendem a percorrer maiores distâncias com velocidades mais elevadas, de modo a capitalizar em golo os espaços que se abrem no meio-campo ofensivo, com a progressão espacial da equipa oponente que procura reentrar na discussão do jogo. Além disso, a jogar em casa, as equipas cobrem maiores distâncias em velocidades média, alta, muito alta e sprint, comparativamente aos visitantes, o que corrobora a existência do famigerado “efeito de jogar em casa”.
Ao fazer este tipo de análise, é importante que as equipas técnicas e os analistas considerem o tempo efetivo de jogo e não o tempo total de jogo, pois só assim serão apurados dados precisos sobre as exigências físicas em competição. Por exemplo, se um período com a bola fora é contemplado na quantificação da performance, as demandas físicas a que os jogadores estão sujeitos podem ser subestimadas.
Independentemente do índice de vitória e da localização
do jogo, as evidências indicam que as equipas mais bem classificadas percorreram
maiores distâncias total e em velocidades média e muito alta (dimensão de
efeito pequeno), relativamente a equipas de menor qualidade. Urge entender que,
muito provavelmente, as melhores equipas correm menos, porque,
concomitantemente, passam mais tempo em posição de vantagem no marcador. Em
processo de treino, a manipulação do resultado e das relações numéricas pode
ser uma estratégia profícua para lidar com as vicissitudes dos diversos
contextos com que as equipas se deparam em competição.
Conclusão
Este estudo mostrou que a performance de corrida em jogo é altamente dependente de variáveis situacionais, especialmente as circunstâncias associadas à evolução do marcador. Além disso, o resultado corrente do jogo afetou, de forma distinta, a prestação da corrida de jogadores a atuar em diferentes posições. Em situação de derrota, os defensores aumentaram as distâncias percorridas em velocidades média, alta, muito alta e sprint, enquanto os jogadores atacantes manifestaram a tendência oposta. Em casa, as equipas percorreram maiores distâncias de corrida em velocidades média, alta, muito alta e em sprint.
Estas evidências devem ser verificadas noutras
competições e em outros países. É possível que a idiossincrasia de cada liga,
na qual determinadas características de jogador ou estilos de jogo são
enfatizados, possa alterar os resultados apresentados nesta investigação.
P.S.:
1-
As que
constam neste texto foram originalmente escritas pelos autores do artigo e,
presentemente, traduzidas para a Língua Portuguesa;
2-
Para melhor compreender as
ideias acima referidas, recomenda-se a leitura integral do artigo em questão;
3- As citações efetuadas nesta rúbrica foram utilizadas pelos autores do artigo, podendo o leitor encontrar as devidas referências na versão original publicada na revista International Journal of Sports Science & Coaching.
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