Quando o Presidente da República visitou Monchique por mera curiosidade é um livro de contos do escritor, meu conterrâneo, António Manuel Venda. Foi
recentemente reeditado (3ª edição) pela JustMedia, após ter sido lançado
inicialmente pela editora Pergaminho, em 1996. Nesta nova edição, o autor
contou com a colaboração de entidades autárquicas do concelho de Monchique, em
especial da Junta de Freguesia de Monchique, que teve um papel ativo na
promoção e na apresentação do livro junto da população local.
Imagem: Capa de "Quando o Presidente da República visitou Monchique por mera curiosidade" de António Manuel Venda (fonte: planetalgarve.com).
Pessoalmente, enfatizo a
criatividade das histórias e a qualidade de expressão escrita do autor. Alguns
contos são surreais, mas de uma imaginação soberba. O real funde-se com a
fantasia, resultando numa sátira evidente à sociedade contemporânea, mesmo tendo
os contos sido escritos há um bom par de décadas. Não deixa de ser irónico em
tempos de crise.
A maioria dos
contos tem por sede geográfica o concelho de Monchique e, como massa humana, as
suas gentes, com destaque para algumas personagens reais.
“Ao Zé das Cabras muita gente gritava «Ó das cabras!», e ele respondia
sempre «Ó dos cabrões!».”
(p.87 in Crónica de Badajoz)
Um simples excerto que
me fez regressar, como que por magia, à minha infância e recordar as partes do
malogrado Zé das Cabras. Era no Largo dos Chorões, era no Largo de São
Sebastião, era na Rua do Porto Fundo, havia sempre um «Ó das cabras!» e o
correspondente «Ó dos cabrões», vulgarmente condimentado por outra meia dúzia
de palavrões que não vale a pena aqui especificar. Depois, era a risada geral.
Ao acabar de ler um livro, gosto de refletir sobre o que li. Desta feita, por o achar particularmente
interessante e muito bem conseguido, foquei-me no título. E se o nosso
presidente da república viesse mesmo a Monchique por mera curiosidade?
“Algo quase improvável”,
pensei. O prof. Aníbal
Cavaco Silva não tem agenda para meras curiosidades. Quiçá estimulado pelo
imaginário de António Manuel Venda, talvez cá viesse se ocorresse um evento de
proporções calamitosas como, por exemplo, a erupção do tão famigerado vulcão
que a Picota encerra (diz-se que foi um vulcão, diz-se que está extinto, mas
que eu saiba ninguém comprovou a sua existência). Aí, talvez o presidente da república
tirasse um tempo para visitar Monchique; não seria era por mera curiosidade,
mas sim por mera formalidade.
Num contexto de normalidade, sem cenários catastróficos, também o imaginei a discursar num palanque colocado no Mirante e a elogiar a magnificência
da vila e da serra. A referir Monchique como “uma linda vila verdejante do
interior alentejano”. Sim, imaginei a “gaffe” e a sua visão “macro”, não de “macroscópica”,
mas de “macroeconómica”, porque o presidente é um homem de dinheiros. Quando se perceciona o mundo de uma lente angular “macro”, qualquer terra do interior, ainda para mais num dos
extremos do país, não assume qualquer significado ou ponto de interesse. Algarve
ou Alentejo? Dá no mesmo.
Para concluir, endereço
os meus sinceros parabéns às freguesias do concelho (Alferce, Marmelete e
Monchique) por apoiarem António Manuel Venda a reeditar este seu livro.
Monchique, o seu património cultural e o seu potencial humano merecem ser devidamente
valorizados. Contudo, como “santos da casa não fazem milagres”, é pena que as
pessoas tenham, primariamente, de fugir de cá para verem os seus méritos e o seu
talento reconhecidos.
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