A grande penalidade é um
evento muito peculiar num jogo de futebol, uma vez que a comum interação entre
22 jogadores é temporariamente reduzida a um confronto direto entre o jogador
que marca o penalti e o guarda-redes adversário. No âmbito de uma investigação
em curso, decidi comparar alguns dados relativos à marcação de grandes
penalidades por Lionel Messi (Barcelona) e Cristiano Ronaldo (Real Madrid),
exclusivamente na UEFA Champions League,
desde a época 2010/2011 até à atual. Apenas foram consideradas as grandes penalidades assinaladas durante o tempo regulamentar dos jogos, ou seja, prolongamentos e desempates por grandes penalidades não foram incluídos.
A justificação para
escolher estes jogadores é óbvia: nos últimos sete anos (2008-2014), o melhor
jogador do mundo para a FIFA ou foi Messi (2009, 2010, 2011 e 2012) ou foi
Ronaldo (2008, 2013 e 2014). Neste sentido, o objetivo deste texto não se
prende com esgrimir argumentos sobre qual dos dois é melhor; antes, tem como
propósito fazer uma análise comparativa entre dois jogadores que, acima de
tudo, já marcaram uma era do futebol mundial. Para nós – adeptos da modalidade
– é e será sempre um privilégio afirmar que vimos (in loco ou não) jogar estes 2 craques.
Comecemos por Messi (ver
figura 1).
O argentino marcou 7
golos em 10 grandes penalidades, portanto, com uma eficácia de 70%. A única
bola que colocou na metade superior da baliza falhou o alvo. As 9 restantes
foram colocadas na metade inferior da baliza, sendo duas delas defendidas pelos
guarda-redes. A zona preferencial foi o canto inferior direito, embora não se
tenha verificado uma propensão para rematar exclusivamente para o lado direito
da baliza. Curiosamente, os remates direcionados para o lado esquerdo da baliza
(i.e., canto inferior esquerdo e centro inferior esquerdo) – por alguns autores
considerado o «lado não natural» para indivíduos esquerdinos (e.g., Chiappori et al., 2002; Noël et al., 2015) – obtiveram eficácia máxima (100%).
A figura 2 exibe os dados relativos ao português Cristiano Ronaldo.
Num total de 11 grandes
penalidades, Ronaldo marcou 9 golos, sendo a eficácia de 81,8%. Comparativamente
a Messi, constata-se uma maior dispersão dos remates pelas 8 zonas da baliza. A
figura 2 sugere que Ronaldo, para além de ser mais eficaz do que Messi na
marcação de grandes penalidades, é também mais imprevisível. Os três penaltis
batidos para a metade superior da baliza deram golo. Os restantes 8 foram
direcionados para a metade inferior da baliza; 2 foram defendidos pelos
guarda-redes contrários e 6 resultaram em golo. A eficácia foi mais reduzida no
lado esquerdo da baliza, aquele que é considerado pelos investigadores como o «lado
natural» para indivíduos destros (Chiappori et
al., 2002). Aliás, a tendência de Ronaldo foi mesmo para rematar para a metade
esquerda da baliza adversária (9 em 11), ainda que para zonas distintas.
Para concluir, na Champions League, Ronaldo tem sido mais
eficaz que Messi na marcação de grandes penalidades. Se o valor obtido por Messi
está dentro das taxas de sucesso reportadas na literatura científica (70-81%),
a eficácia de Ronaldo encontra-se ligeiramente acima. A maior eficácia do
português pode dever-se ao facto de ser mais imprevisível na zona em que
procura colocar a bola. Atualmente, os estudos recomendam que os jogadores
direcionem o remate para as zonas altas da baliza, pois a probabilidade da bola
ser defendida pelos guarda-redes reduz drasticamente e a taxa de sucesso é por
norma mais elevada (López-Botella & Palao, 2007; Bar-Eli & Azar, 2009).
O facto de maior interesse prende-se com a eficácia dos 2 craques ser menor
quando rematam para o seu «lado natural», tendo em conta a respetiva
lateralidade. A amostra recolhida por cada jogador é muito pequena, pelo que
este breve exercício não deve ser extrapolado para outras competições.
Referências
Bar-Eli, M. & Azar, O. H.
(2009). Penalty kicks in soccer: An empirical analysis of shooting strategies and
goalkeepers’ preferences. Soccer & Society, 10(9), 183-191.
Chiappori, P.-A., Levitt,
S., & Groseclose, T. (2002). Testing mixed-strategy equilibria when players
are heterogeneous: The case of penalty kicks in soccer. The American
Economic Review, 92(4), 1138-1151.
López-Botella, M., &
Palao, J. M. (2007). Relationship between laterality of foot strike and shot
zone on penalty efficacy in specialist penalty takers. International Journal
of Performance Analysis in Sport, 7(3), 26-36.
Noël, B., van der Kamp, J.,
& Memmert, D. (2015). Implicit goalkeeper influences on goal side selection
in representative penalty kicking tasks. PLOS ONE, 10(8), e0135423. doi:10.1371/journal.pone.0135423.
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