Há uns dias, numa busca casual, deparei-me com um artigo apelativo de dois investigadores turcos. Akpinar e Bicer (2014) fizeram uma extensa
revisão da literatura acerca da lateralidade no desporto e procuraram identificar os
motivos pelos quais os indivíduos esquerdinos (ou canhotos) estão
sobrerrepresentados em certas modalidades.
Em primeira instância, os autores constataram que a
incidência de indivíduos canhotos nas modalidades desportivas de interação
(i.e., jogos desportivos coletivos) tende a ser frequentemente superior à
incidência de canhotos na população geral. Por exemplo, 13% dos jogadores da
NBA, na época 2013/2014, eram canhotos; em média, 28.5% dos jogadores de
equipas de andebol são canhotos; o Arsenal, na época 2013/2014, tinha 36% de
jogadores esquerdinos na sua equipa principal de futebol. Todos estes valores
são superiores aos valores relativos de 8-10% de canhotos, observados em
diversos estudos transculturais para a população em geral.
Esta evidência é interessantíssima e suscitou a
necessidade de obter uma resposta plausível para o facto. Porque é que tal
sucede? Pois bem, de acordo com a pesquisa efetuada por Akpinar e Bicer (2014),
foram colocadas duas hipóteses explicativas:
a) Hipótese da superioridade inata: baseada em vantagens decorrentes de predisposições percetivas
e neuropsicológicas dos canhotos (e.g., tempos de reação mais curtos, melhor
capacidade de antecipação) e de adaptações anatómicas (cérebros mais
simétricos, com conexões mais amplas e eficientes entre os dois hemisférios);
b) Hipótese da frequência negativa: vantagem dos esquerdinos derivada da menor experiência
dos adversários em lidar com estruturas de movimentos menos frequentes, ou
seja, determina uma menor afinação dos oponentes destros às ações produzidas
pelos indivíduos canhotos (desvantagem no desenvolvimento de abordagens estratégico-táticas).
Por outro lado, nos desportos
coletivos, a presença de sujeitos esquerdinos pode oferecer uma panóplia de
soluções ao treinador que não devem ser descuradas. O ponta direito no andebol,
por exemplo, ao ser canhoto aumenta substancialmente o ângulo de abordagem à
baliza (remate) e, consequentemente, as possibilidades de marcar golo. No
futebol, a presença de um extremo canhoto, permite que o treinador opte por
jogar ou com extremos invertidos (procura de zonas interiores do espaço de
jogo), ou de uma forma mais clássica, com os extremos a procurar a profundidade
pelos corredores laterais para cruzar. Portanto, possuir canhotos num
plantel/equipa aumenta o leque de opções estratégico-táticas do treinador.
Claro que isto depende da especificidade de cada modalidade.
Imagem: O canhoto Diego Maradona no Nápoles (fonte: Getty Images). |
Depois, é a beleza e a «magia» que
um jogador canhoto oferece ao jogo/modalidade. Quem não conhece os nomes Di Stefano,
Maradona, Maldini, Roberto Carlos, Rivaldo, Giggs, Messi, Robben, Özil, Van
Persie, Di Maria, David Silva, Gareth Bale, James Rodríguez, entre muitos outros? E o
mais curioso é que, no que respeita a modalidades desportivas individuais (e.g.,
ginástica), não se verificou qualquer sobrerrepresentação de sujeitos
esquerdinos. Então, serão estes indivíduos mais talhados para contextos de
interação (cooperação e oposição)? Talvez a ciência, um dia, nos esclareça a
dúvida.
Referência
Akpinar, S., & Bicer, B. (2014). Why left-handers/footers are overrepresented in some
sports? Montenegrin Journal of Sports
Science and Medicine, 3(2), 33-38.
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