Nota prévia: O artigo científico alvo da presente síntese foi selecionado em função dos seguintes critérios: (1) publicado numa revista científica internacional com revisão de pares; (2) publicado no último trimestre; (3) associado a um tema que considere pertinente no âmbito das Ciências do Desporto.
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Autores: Eldridge, D., Pocock, C.,
Pulling, C., Kearney, P., & Dicks, M.
País: Inglaterra
Data de publicação: 4-setembro-2022
Referência: Eldridge,
D., Pocock, C., Pulling, C., Kearney, P., & Dicks, M. (2022). Visual
exploratory activity and practice design: Perceptions of experienced coaches in
professional football academies. International Journal of Sports Science
& Coaching. https://doi.org/10.1177/17479541221122412
Figura 1. Informações editoriais do artigo do mês 34 – outubro de
2022.
Apresentação do problema
A qualidade do desempenho em contextos dinâmicos e temporalmente constrangidos pode ser sustentada pela capacidade do jogador em explorar visualmente o envolvimento no sentido de identificar oportunidades de ação (Jordet et al., 2020; McGuckian et al., 2018). A natureza dinâmica dos jogos desportivos, como o futebol, requer que os jogadores prestem atenção aos movimentos dos companheiros de equipa e dos adversários para orientar as ações subsequentes (Eldridge et al., 2013). A investigação existente tem reconhecido a importância de competências percetivo-cognitivas, como o reconhecimento de padrões (North et al., 2009), a antecipação (Roca et al., 2011) e a pesquisa visual (Savelsbergh et al., 2002), em performances de excelência no futebol. Mais recentemente, os estudos no futebol têm analisado a “atividade de exploração visual” (McGuckian et al., 2020; Pocock et al., 2019), o “comportamento de exploração visual” (McGuckian et al., 2017) e o “scanning” (Aksum et al., 2021; Jordet et al., 2020), que, no cômputo geral, referem-se aos movimentos corporais e da cabeça que envolvem desviar o olhar da bola para orientar o controlo prospetivo de ações futuras.
A relevância da atividade de exploração visual em ambientes competitivos tem sido destacada em estudos analíticos no âmbito da performance desportiva, surgindo a frequência de exploração visual associada à precisão do passe na Premier League inglesa (Jordet et al., 2013, 2020) e em campeonatos europeus de futebol em idades juvenis (Aksum et al., 2021). Porém, apesar de investigadores e treinadores reconhecerem a importância dos comportamentos de pesquisa visual para a performance de alto nível no futebol (Pulling et al., 2018), pouquíssimos estudos têm investigado a eficácia do design de atividades práticas no aumento da frequência e na melhoria da qualidade do ato de exploração visual de jovens praticantes.
Na generalidade, uma maior exploração visual tem sido ligada a desempenhos com bola mais bem conseguidos, embora vários fatores contextuais possam influenciar a frequência de comportamentos de pesquisa visual. A regularidade destes comportamentos pode variar em função de exigências posicionais no seio da equipa: por norma, executam-se mais varrimentos por segundo em posições centrais (e.g., defesas centrais e médios-centro), comparativamente a posições periféricas (e.g., defesas laterais) (Jordet et al., 2020). Além disso, a proximidade dos oponentes pode influenciar a frequência de busca visual, já que, tipicamente, os jogadores realizam mais movimentos com a cabeça quando estão longe da bola e, por isso, sob menor pressão defensiva (Aksum et al., 2021). Por seu turno, sob intensa pressão, os jogadores não realizam tantos “scans”, pois há o risco acrescido de perderem a posse de bola enquanto desviam o olhar da mesma para preparar ações futuras. A verdade é que, se os jogadores forem capazes de efetuar atividades de exploração visual sob intensa pressão, reunirão melhores condições para superar a oposição dos adversários. A compreensão destes constrangimentos pode ajudar a que os treinadores concebam atividades práticas mais efetivas para incrementar a qualidade dos comportamentos de exploração visual dos jogadores.
O comportamento visual de procura de informações do
envolvimento varia em função do escalão etário. Por exemplo, jogadores Sub-19
exploraram mais o envolvimento que indivíduos Sub-17 em campeonatos europeus
nessas categorias (Aksum et al., 2021). Mesmo em condições simuladas de
futebol, em contexto laboratorial, os jogadores mais velhos executaram mais
movimentos com a cabeça (McGuckian et al., 2020). Porém, uma vez que pode haver
um “efeito de teto” em jogadores internacionais de elite, compreender como os treinadores
de futebol delineiam a prática para jovens praticantes pode contribuir para que
a investigação forneça pistas valiosas para a melhoria de competências
percetivas no decurso do processo de formação de futebolistas. Essencialmente,
urge entender como é que se treinam comportamentos de exploração visual no
terreno, em tarefas representativas (figura 2).
Figura 2. O design de tarefas representativas no
desenvolvimento de comportamentos de pesquisa visual (imagem não publicada
pelos autores).
Os treinadores de futebol mais experientes e com mais
qualificações destacaram que o treino da exploração visual deve ser introduzido
desde idades baixas e pode ser estimulado através de instruções diretas,
aplicando constrangimentos e questionamento (Pulling et al., 2018). Os
treinadores que raramente trabalham comportamentos de pesquisa visual
mencionaram a existência de barreiras para desenvolver capacidades percetivas
(e.g., dificuldade na estruturação de tarefas e falta de recursos para entender
tais comportamentos). Para superar estas barreiras, a realização de entrevistas
com treinadores experientes pode facultar exemplos de atividades práticas
direcionadas para a melhoraria da exploração visual em jovens futebolistas. O
objetivo deste estudo foi entender como é que treinadores, com experiência em
contexto de academias profissionais de futebol, conceptualizam os
comportamentos de exploração visual e como é que aplicam essa conceção na
estruturação de tarefas práticas.
Participantes: 9 treinadores masculinos a trabalhar no seio de uma academia da Federação Inglesa de Futebol pertencente a um clube profissional que atua nas 4 divisões mais altas de Inglaterra (Premier League, Championship, League 1 e League 2). Os treinadores (idade, média ± desvio-padrão: 40 ± 9.6 anos; experiência de treino no futebol: 18 ± 6.1 anos) foram selecionados porque são responsáveis por uma equipa da academia e porque, em termos de qualificações, possuem licenças UEFA A (n = 5) e UEFA B (n = 4).
Procedimentos: os dados foram obtidos de entrevistas semiestruturadas para conhecer aprofundadamente as perspetivas dos treinadores sobre a atividade de exploração visual. O guião da entrevista passou por uma fase de estudo piloto, com um treinador com licença UEFA B, após o qual os investigadores puderam fazer pequenos ajustes nas questões propostas e na organização das mesmas. As questões eram abertas, por forma a conceder oportunidade aos investigadores de sondar as respostas dadas pelos treinadores. O guião da entrevista foi dividido em 3 secções: 1) questões sobre o background dos participantes enquanto treinadores (e.g., Por favor, pode dizer-me como começou a desenvolver a atividade de treinador?); 2) questões sobre as perceções e as experiências dos treinadores em orientar sessões de treino para desenvolver a exploração visual dos jovens jogadores (e.g., Acha que a atividade de exploração visual tem mais importância em determinadas idades?); 3) com base na experiência acumulada, os participantes foram convidados a desenhar e a descrever exercícios que eles achavam que poderiam aprimorar a perceção visual dos jovens futebolistas. As entrevistas foram conduzidas pelo autor principal presencialmente, cara a cara, numa localização escolhida pelos treinadores. As entrevistas duraram entre 32 e 48 minutos e foram gravadas através da aplicação para telemóvel Smart Recorder 7 (Version 2.1, 2009–2013 Roe Mobile Development). Posteriormente, o conteúdo das entrevistas foi transcrito à letra para análise dos dados.
Análise dos dados:
· Entrevista
Neste estudo, o autor principal recorreu a um modelo de 6
fases para realizar a análise dos temas (Braun et al., 2016): familiarização
com os dados, produção de códigos iniciais, procura de temas, revisão dos
temas, definição e nomeação dos temas e produção do relatório. O autor
principal adotou uma abordagem indutiva, pesquisando semelhanças e diferenças
nos dados e descrevendo temas. Os códigos iniciais foram desenvolvidos em temas
mais amplos, que, depois, foram revistos e redefinidos pela equipa de
investigação. Após completar a definição e a nomeação dos temas, o investigador
principal reviu os códigos dos dados em bruto e os temas. Os outros coautores
realizaram uma apreciação crítica dos códigos e dos temas para tornar o
racional da organização dos dados mais robusto.
· Exemplos dos exercícios práticos
As atividades
práticas apresentadas pelos treinadores foram categorizadas segundo a proposta
avançada por Roca e Ford (2020) (tabela 1).
Tabela 1. Categorias e
definições das atividades relacionadas com a prática de futebol utilizadas na
análise (adaptado de Roca & Ford, 2020).
· Qualidade e rigor da investigação
Para
aumentar o rigor metodológico do estudo, foi cumprida uma série de passos
para assegurar a fiabilidade dos dados (Smith & McGannon, 2018): a seriação
dos participantes foi executada através de critérios específicos (qualificações
próprias; papel atualmente desempenhado); explicação dos objetivos do estudo
antes do começo das entrevistas; o entrevistador tinha uma longa experiência no
treino de futebol (14 anos), incluindo o facto de ter sido treinador numa
academia profissional de futebol e possuir a licença UEFA A; os
coautores atuaram como “amigos críticos” do investigador principal, ao rever e
criticar os procedimentos adotados em todas as fases de análise do conteúdo das
entrevistas. Foram, também, calculadas as fiabilidades intra e interobservador
para a análise das tarefas práticas propostas pelos treinadores, sendo os
valores de concordância ambos muito elevados (k = 1.0; k = 0.81,
respetivamente).
Principais resultados
Os resultados deste estudo permitem (1) estreitar a
brecha existente entre a atividade de exploração visual dos jogadores e o
design de atividades práticas e (2) introduzir conhecimento aplicado sobre o
tipo de exercícios que os treinadores consideram efetivo para desenvolver a
exploração visual dos jogadores. A análise de conteúdo dos dados identificou 3
temas fundamentais: a importância da atividade exploração visual, o desenvolvimento da
atividade exploração visual e a transmissão da atividade de exploração visual.
·
Importância da
atividade de exploração visual
No decurso das entrevistas, os treinadores aludiram a
jogadores de futebol de elite nos anos mais recentes, como Paul Scholes, Frank
Lampard, Andrea Pirlo e Cristiano Ronaldo, para enfatizar a importância da
perceção visual no jogo. De facto, a atividade de exploração visual permite que
os jogadores orientem efetivamente as suas ações subsequentes com ou sem bola:
Treinador 2: Eu penso que é relevante, os jogadores
saberem o que necessitam de fazer antes de receber a bola, onde está o espaço,
é crucial no suporte do processo de tomada de decisão.
Treinador 7: Oh, sem dúvida, o varrer com o olhar é
massivo, nós dizemos aos jogadores, e continuamos a dizer-lhes: como podemos
acelerar o jogo? Como podemos tornar os nossos passes mais efetivos? Como
podemos tornar o nosso jogo mais fluído? E retornamos aos simples pré
movimentos, olhar por cima do ombro, ter ideias, fixar imagens antes de receber
a bola.
Os treinadores manifestaram que a habilidade para jogar
com perspetivas de 360 graus é essencial para uma tomada de decisão eficaz,
especialmente em certas posições:
Treinador 2: Eu não acho que haja uma sessão em que eu
não diga aos jogadores “levantam a cabeça, levantem a cabeça, olhem à vossa
volta”, não olhar apenas em frente, mas por cima do ombro e chegar aos 360
graus, porque o futebol é 360 graus.
Treinador 1: Eu especialmente entendo que é vital para
um médio centro, a posição na qual eu próprio joguei e é tão importante saber o
que se passa à nossa volta quando estamos no meio do “parque”.
· Desenvolvimento da atividade de exploração visual
Os treinadores entendem
que, para que os jogadores desenvolvam atividades de exploração visual
proficientes, eles precisam de desenvolver este comportamento desde idades
baixas:
Treinador 4: Eu considerá-lo-ia como um fundamento do
jogo e, quando tu falas acerca dos fundamentos, devem ser trabalhados entre os
5 e os 11 anos de idade. Portanto, para mim, necessita de ser ensinado nessa
faixa etária, e não penso que se deva parar a partir de então… tu sabes, quando
se olha para o [Andrea] Pirlo, tu nunca alcanças um nível de topo quando
entendes que não necessitas de fazer mais isso. (…) tão importante quanto
receber competências, é transmitir as competências que ensinas aos 5, 6, 7, 8 e
9 anos.
Alguns treinadores questionaram
se a atividade de exploração visual pode ser desenvolvida em idades
posteriores. Surgiu a dúvida se o desenvolvimento desta competência percetiva
em crianças/jovens alguma vez alcance níveis de mestria, caso o comportamento
não seja estimulado desde idades jovens:
Treinador 3: (…) porque eu não tenho certeza de que se
chegares aos 14 sem nunca ter executado o comportamento, que consigas
apanhá-lo, não tenho a certeza de que chegues lá. Eu estou a tentar fazê-lo
agora com jovens com 16 e 17 anos de idade e não é natural para eles, nunca o fizeram
antes, nem nunca lhes foi mostrado antes.
Treinador 4: Eu acho que quanto mais tarde começares a
fazê-lo, mais difícil se torna.
As evidências
experimentais parecem contradizer as perspetivas destes treinadores. O
potencial para desenvolver atividades de exploração visual na adolescência
tardia é suportado por diversos estudos, entre os quais, um mostrou que
jogadores Sub-19 exploraram visualmente mais que jogadores Sub-17 em jogos de
Campeonatos Europeus (Aksum et al., 2021).
· Transmissão da atividade de exploração visual
Os treinadores exibiram
uma atitude positiva para o treino da atividade de exploração visual e para o
papel importante que tem no desenvolvimento do jogador. Apesar desta atitude
positiva, parece que a maioria dos treinadores não coloca um foco especial
nestes comportamentos durante as sessões de treino:
Treinador 1: É uma tendência que adoto ao longo das
minhas sessões, não diria “oh, esta noite os rapazes vão trabalhar os seus
sentidos visuais”. Eu colocaria isso em qualquer sessão que faço.
Treinador 9: É interessante porque eu não diria que
vou para um treino a pensar que vou desenvolver as competências visuais dos
jogadores.
Os treinadores mencionaram
que utilizam diversos métodos para aprimorar a exploração visual nas sessões de
treino. O método mais comum prende-se com o design de exercícios de treino e,
especificamente, recorrendo a atividades com oposição:
Treinador 4: Os rapazes necessitam de entender o jogo
e que o processo de tomada de decisão só vai surgir quando há meia oposição ou
oposição e o “scanning” é a base para isso; se eles não sabem o que se passa à
sua volta, então não interessa o quão bem eles batem na bola de A para B,
porque nunca a vão ter.
Os exercícios são uma
parte integral do processo de treino e é crucial que os treinadores considerem
como é que as tarefas devem ser estruturadas para facilitar a aprendizagem e a
aquisição de competências específicas do futebol. Por isso, o facto de alguns
treinadores não manifestarem certeza sobre o tipo de exercícios que deve ser
proposto para fomentar o desenvolvimento da exploração visual revelou-se
surpreendente:
Treinador 9: Eu ficaria muito interessado em saber que
tipo de exercícios melhoram as competências visuais dos jogadores.
O recurso à vídeo-análise
é outro passo positivo no processo de treino, uma vez que demonstra que os
treinadores trabalham e valorizam outras disciplinas para promover o
desenvolvimento do jogador:
Treinador 9: Eu gosto de usar clips de vídeo… Eles
necessitam de ser capazes de se autorreconhecer. Eu fiz coisas no passado em
que levei o meu iPad para a sessão de treino, filmei o jogador por dois
minutos, tirei-o da situação e mostrei-lhe exatamente o que pretendia.
Treinador 2: Eu posso definitivamente pensar em alguns
jogadores com quem tenho trabalhado… ao nível da academia e ao nível da
primeira equipa, talvez não varram tão bem o jogo quanto deveriam e eu penso
numa situação em que tu possas olhar para destacar na tua análise ou no teu
DVD, portanto, tu sentar-te-ias com o jogador e mostrar-lhe-ias visualmente que
não está a fazê-lo e também enfatizaria o sucesso quando ele executa o
pretendido.
Os treinadores admitiram
que o questionamento constitui uma ferramenta crucial para desenvolver o
conhecimento e a compreensão das competências de pesquisa visual:
Treinador 8: O trabalho de Mosston e Ashworth [estilos
de ensino] em torno do Q [Question: pergunta] & A [Answer: resposta],
descoberta convergente, descoberta divergente, sou muito mais deste tipo de
coisas, então vais conseguir através de perguntas e respostas de qualquer
maneira. Eu raramente paro os treinos, mas posso falar com as
crianças no decurso da sessão, até coisas simples como: quando tocaste lá, ou
quando recebeste pela última vez, sabias o que estava atrás de ti? Que outras
imagens viste nesse momento? Ou viste aquela pessoa ali?
· Atividades práticas
Cada treinador apresentou
um conjunto de exercícios de treino quando foram questionados sobre o tipo de
práticas que empregam para desenvolver a atividade de exploração visual. Reuniu-se
um total de 33 tarefas de treino estruturadas pelos 9 treinadores (tabela 2).
Tabela 2. Frequências e percentagens de atividades com tomada de
decisão ativa e não ativa propostas pelos treinadores.
A percentagem de
atividades definidas como de tomada de decisão ativa (n = 70%) excedeu a
percentagem de atividades de tomada de decisão não ativa (n = 30%). É
algo preocupante a evidência de que cerca de um terço das tarefas desenhadas
para melhorar competências de perceção visual seja classificado de tomada de
decisão não ativa. Somente foram propostos 3 (9%) exercícios para a manutenção
exclusiva da posse de bola, enquanto 17 (52%) foram classificados como jogos
reduzidos/condicionados. A visão dos treinadores sobre a importância dos jogos
reduzidos/condicionados foi encarada como positiva, já que as oportunidades de
ação (affordances) que emergem são mais consistentes com o que ocorre em
situação de jogo formal.
Aplicações práticas
Em estudos prévios já foi comprovado que os melhores jogadores, pelo menos aqueles que receberam um prémio de prestígio internacional na sua carreira, apresentam mais comportamentos de exploração visual do envolvimento em jogo relativamente aos seus pares (Jordet et al., 2013). Assim, é fundamental que os treinadores reconheçam quais são os atributos-chave que fazem com que jogadores sejam bem-sucedidos ao nível da elite. Este saber pode ajudá-los no processo de treino e a fornecer aos aprendizes modelos para que possam observar bons hábitos de suporte ao seu desenvolvimento.
Recorrer ao questionamento é importante, sem dúvida; porém, conforme verificado no exemplo suprarreferido do treinador 8, os técnicos fazem predominantemente questões convergentes, comparativamente a questões divergentes, que tendem a promover mais o pensamento crítico e a reflexão (O’Connor et al., 2021; Partington & Cushion, 2013). Os treinadores devem ir além da simples evocação do que os jovens viram ou fizeram e da importância excessiva atribuída à obtenção de uma resposta imediata. Neste sentido, sugere-se que os treinadores antecipem a sua intervenção e/ou beneficiem de apoio no planeamento das questões a colocar, por forma a aumentar a eficácia das mesmas no desenvolvimento do desempenho do jogador.
A necessidade de criar e aplicar tarefas de aprendizagem representativas foi um ponto bastante enfatizado. Para estimular e refinar competências do foro percetivo, é essencial que as tarefas práticas envolvam os jogadores em contextos informacionais funcionais, que proporcionem espaços, brechas, relações angulares, distâncias interpessoais, sincronização ou perturbações entre companheiros de equipa e adversários. Para encorajar o desenvolvimento da exploração visual, também é recomendado que sejam propostas atividades com tomada de decisão ativa específicas para as diferentes posições de jogo (por exemplo, os comportamentos de exploração visual dos médios-centro diferem daqueles que são executados por jogadores que atuam em posições mais periféricas: defesas laterais/extremos).
Não é lógico, nem coerente, preparar exercícios com tomada de decisão não ativa (i.e., atividades que não contenham elementos que determinem a tomada de decisão dos jogadores como ocorre no jogo formal) para desenvolver competências visuais nos jogadores. Essas atividades não requerem que os jogadores pesquisem ativamente o envolvimento para identificar oportunidades de ação. A necessidade de “olhar sobre o ombro” ou “adquirir uma visão a 360 graus” cai por terra quando os jogadores já sabem com exatidão o que têm de fazer a seguir antes de receber a bola (e.g., exercícios padronizados).
A promoção de comportamentos de pesquisa visual no treino
deve estar devidamente alinhada com o nível do praticante. Por exemplo, a
redução excessiva da área de jogo individual numa situação reduzida de 3v3 (40
m2/jogador), com crianças Sub-8 em fase de iniciação, produzirá contextos
de pressão que não facilitam o “levantar a cabeça” e o “varrer o jogo com o
olhar” (exploração visual). Por outro lado, à medida que os praticantes se
tornam mais competentes, a criação e a intensidade dos contextos de pressão
devem ser cuidadosamente ponderadas sem que, acima de tudo, se comprometa o
princípio da representatividade da tarefa.
Conclusão
O propósito deste estudo foi aprofundar o entendimento sobre
as atividades práticas propostas por treinadores experientes a trabalhar em
academias de futebol profissionais, no intuito de melhorar os comportamentos de
exploração visual no processo de formação de jovens jogadores. A investigação debruçou-se
sobre (a) a perceção que os treinadores de futebol têm da atividade de
exploração visual e (b) as tarefas práticas produzidas pelos treinadores para
aprimorar a perceção visual dos jovens. Os principais resultados traduzem-se
nos seguintes pontos: 1) os treinadores consideraram a atividade de exploração
visual como uma parte integrante da performance do jogador, que deve ser treinada
desde idades baixas; 2) alguns treinadores não entenderam ser necessário focar
particularmente a perceção visual nas sessões de treino; 3) a melhor forma de
intervir para fomentar estes comportamentos é através do design de atividades
práticas, que podem ser suportadas por adereços visuais, vídeo-análise e
questionamento. As estratégias de intervenção no treino devem continuar a
evoluir para que os jogadores possam desenvolver as suas competências em
consonância com as exigências do jogo. No futuro, a investigação deve
centrar-se no impacto de diferentes tarefas de treino na atividade de
exploração visual do jogador e no transfer para a performance em
competição.
P.S.:
1- As ideias que constam neste texto foram originalmente
escritas pelos autores do artigo e, presentemente, traduzidas para a língua
portuguesa;
2- Para melhor compreender as ideias acima referidas,
recomenda-se a leitura integral do artigo em questão;
3- As citações efetuadas nesta rúbrica foram utilizadas pelos autores do artigo, podendo o leitor encontrar as devidas referências na versão original publicada na revista International Journal of Sports Science & Coaching.
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