06/07/2020

Uma breve reflexão sobre o recrutamento de treinadores para o futebol de formação na era digital

Com a preparação da nova época (2020/2021), há inúmeros clubes que já formalizaram a apresentação de treinadores/equipas técnicas e outros encetaram diligências para contratá-los. Na minha caixa de correio têm caído alguns e-mails com ofertas de trabalho para suprir lacunas em determinados escalões etários de clubes de futebol, em Portugal. São ofertas genéricas enviadas em massa para uma bolsa de treinadores, sendo a seleção dos interessados executada a posteriori. Como último recurso, nada tenho contra, embora seja recomendado a contratação de alguém que conhecemos e reconhecemos competência no seu trabalho (figura 1).

Figura 1. Recrutamento de treinadores para o futebol de formação na era digital (época 2020/2021).


Então, há uns dias, recebi um e-mail com a seguinte mensagem:

 

Oferta de Vaga - Treinador Fut. 11 - Sub.17

 

Boa tarde

O clube X está á procura de treinador para o escalão de sub 17. O cargo é remunerado. A entrevista para o cargo carece de apresentação do CV e do modelo de jogo. 

Cumprimentos,

(…)

O coordenador

 

Reparem que mantive o anonimato da entidade desportiva e do responsável para não ferir suscetibilidades. É uma mensagem perfeitamente normal, que faz alusão à remuneração (ainda há quem trabalhe a custe zero), porém, com um senão: a apresentação do modelo de jogo. Tive de ler duas vezes para, de facto, confirmar que era realidade. 

Imagine-se que sou um potencial interessado, mas não conheço o clube, a sua missão e visão, o seu plano estratégico, os seus objetivos, as características dos jovens que irão constituir o plantel, o seu passado desportivo no clube ou fora dele, a própria competição em que irão estar inseridos, como é que iria apresentar um modelo de jogo minimamente válido? 

Não serviria a entrevista inicial para avaliar a perceção do treinador acerca dos aspetos atrás referidos, dando também a entender o projeto desportivo do cube e aquilo que se pretende, em particular, para o departamento de formação? Neste primeiro momento de contacto, não seria importante conhecer em traços gerais a pessoa, a sua disponibilidade, a sua motivação e, depois, solicitar esclarecimentos sobre o seu percurso enquanto treinador, tendo por base o Curriculum Vitae? E já agora, o que se iria discutir na apresentação de um modelo de jogo fictício: posicionamentos, movimentos, métodos de jogo, esquemas táticos? Será suposto andar com um “modelo de jogo” no bolso para o caso de eu pretender voltar ao ativo? 

É impressão minha ou as prioridades no futebol de formação continuam invertidas em pleno ano de 2020?

Votos de uma boa época para todos!

1 comentário:

LINHA DE PASSE disse...

O coordenador técnico visado neste texto, apesar de primarmos pelo anonimato, contactou-nos de forma altamente cordial e respeitadora. Porque cremos que todos têm direito de resposta, publicamos em seguida o esclarecimento prestado pelo treinador:

"Boa tarde. Tendo em conta o vosso último Post que me senti visado (não de uma forma negativa, até porque me parece algo discutível) contacto-vos para esclarecer o meu pedido de colaboração á ANTF. Faço o contacto com os treinadores desta forma porque infelizmente a grande maioria não tem um documento devidamente organizado que lhe permita balizar objetivos e princípios. Não o uso com o propósito de tirar nabos da púcara como o artigo faz parecer, mas antes para ter um tema de conversa com os treinadores que a nós se apresentam. Obviamente que posteriormente apresentamos aquilo que para nós é o caminho de formação que pretendemos, mas garanto que não é suportado em sistemas, nem em jogares visto na tv. Infelizmente a realidade é que no nosso meio existem inúmeros casos em que o cargo de treinador não é remunerado, aliás é das primeiras questões que os treinadores que a nós se apresentam fazem... Á vossa disposição para qualquer esclarecimento! Abraço!"