09/03/2017

Ainda no rescaldo da «remontada» histórica: A individualidade e o processo

Ontem, na noite de decisões dos oitavos-de-final da UEFA Champions League 2016/2017, o FC Barcelona virou uma eliminatória que parecia praticamente perdida, após a goleada sofrida (4-0) no Parque dos Príncipes, em Paris. Longe de pretender debater as causas desta «remontada», como dizem os espanhois, irei colocar o enfoque numa sequência ofensiva da equipa parisiense no jogo da primeira mão, por traduzir completamente aquilo que mais aprecio no futebol contemporâneo: a capacidade ofensiva de uma equipa, um coletivo, em «desmontar» a organização defensiva adversária. Vejamos o vídeo seguinte:


Num contexto de reposição de bola em jogo através de pontapé de baliza, temos no terço no terreno de jogo visível uma situação de Gr+4v4 (figura 1). O PSG encontrava-se a vencer (2-0), aos 55 minutos, diante de uma super equipa chamada Barcelona. A questão que se impõe é: quantas equipas – mesmo de elite! – não abdicariam de sair a jogar curto pelo corredor central, colocando a bola diretamente numa zona de menor risco, perante o contexto em questão? Repare-se, um golo do Barcelona neste período tornaria tudo mais complicado para a equipa da casa.

Figura 1. O pontapé de baliza do PSG, aos 55 minutos, que dá origem ao 3-0.

O desenrolar da sequência ofensiva é extraordinário: 19 segundos, 6 jogadores envolvidos na jogada, 17 toques sobre a bola, 5 passes, 1 remate e 1 golo. Praticamente 1 toque na bola por segundo (0.89). O risco de Trapp ao colocar a bola no corredor central, a competência de Rabiot a «rodar» perante a pressão de Messi, os toques sublimes de Draxler e Matuidi a perturbar a organização defensiva dos blaugrana, «libertando» o lateral esquerdo Kurzawa em mobilidade para o corredor central e assistir o genial Di Maria. A excelente finalização culminou um processo ofensivo absolutamente espetacular.

O modelo de jogo do PSG, e este processo ofensivo em particular, denunciam confiança e crença da equipa técnica comandada por Unai Emery nas virtudes dos seus jogadores. À semelhança do Judo, tais processos fazem da forte pressão defensiva adversária o fulcro para o sucesso, assumindo por inteiro o risco. De uma forma prosaica, são métodos que preconizam comportamentos coletivos do género que permitem que a individualidade atinja a sua máxima expressão. Ao invés, há processos que condicionam a manifestação do potencial individual e, na mesma linha de raciocínio, há individualidades incapazes de dar substância a determinados modelos. O ideal é mesmo ter bons ovos e saber cozinhar omeletas saborosas. Posto isto, nem só de inglória vive um técnico derrotado e este espanhol, nesta eliminatória, poderia muito bem não ter acabado na condição de eliminado.

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