21/08/2019

Amazónia em chamas

Sobre os incêndios que lavram há 17 dias na densa floresta da Amazónia – o designado “pulmão da Terra”, alegadamente responsável pela produção de 20% do oxigénio que respiramos e que não passa de um mero mito. Há espécies a desaparecer todos os anos. O declínio da sustentabilidade do nosso habitat natural é progressivo. O mais importante de tudo continua a ser a economia, o crescimento, o deficit, a greve, o ter mais do que o vizinho.

Figura 1. Amazónia fustigada por incêndios dantescos (fonte: visao.sapo.pt).

Apregoamos a plenos pulmões que somos a espécie mais inteligente, mas temos as prioridades totalmente invertidas. Pelos erros de uma espécie, pagam todas as outras e sem direito a segundas oportunidades. Não há descontos, só liquidação total.

12/08/2019

Implicações da introdução do VAR no futebol profissional

O VAR (Video Assistant Referee) foi oficialmente introduzido na principal liga portuguesa (Liga NOS) na época 2017/2018, depois do sistema ter sido testado na final da Taça de Portugal da época 2016/2017. De facto, Portugal foi um dos países pioneiros na adoção deste sistema tecnológico que, entretanto, foi utilizado no Campeonato do Mundo da FIFA 2018, a partir dos oitavos-de-final da UEFA Champions League da época 2018/2019 e, mais recentemente, na FA Premier League 2019/2020. Entretanto, países como a Alemanha, a Espanha e a Itália, entre outros, já haviam implementado o VAR nas respetivas ligas domésticas. O VAR está, na atualidade, altamente disseminado por todo o mundo e, portanto, urge questionar que modificações poderá a introdução deste sistema acarretar na dinâmica do jogo.

Figura 1. Sinalética de revisão de lance através do VAR (fonte: IFAB).

Numa primeira análise, Haugen (2019) sugeriu que o VAR seria prejudicial para o futebol, pois reduziria a incerteza dos resultados a níveis que comprometeriam seriamente o interesse competitivo do jogo. Este autor adianta que o VAR irá beneficiar as melhores equipas, o que não deixa de ser irónico, uma vez que o seu principal propósito é aumentar a justiça das decisões tomadas pela equipa de arbitragem em campo. Ora, se o VAR apenas atua em 4 contextos muito específicos (1: golo ou não golo; 2: penálti ou não penálti; 3: falta passível de expulsão – cartão vermelho direto; 4: má identificação de um jogador aquando de uma advertência/cartão amarelo ou expulsão/cartão vermelho), tenderá a reduzir as injustiças relativas às equipas que detêm mais a bola e que atacam mais, promovendo um decréscimo da probabilidade de visualizarmos mais desfechos do tipo David e Golias. Se este último argumento é, para mim, no mínimo discutível, o próximo nem é tanto. Haugen (2019) também alega que o VAR aumenta o número de paragens num jogo que per se apresenta paragens naturais mais do que suficientes (e.g., pontapés-livres, pontapés de canto, lançamentos laterais, penáltis, foras-de-jogo, substituições, etc.), o que o torna mais aborrecido em relação a outras modalidades desportivas.

Para estimular a discussão, observemos o vídeo seguinte do jogo West Ham United FC x Manchester City FC, da primeira jornada da FA English Premier League, no passado dia 10 de agosto de 2019.


O VAR invalidou o golo por escassos milímetros, presumo (figura 2). Embora a tecnologia vise reduzir a injustiça no jogo, levantou-se uma onda de contestação de que está a “matar a essência do futebol” e que é um “crime anular um golo destes”. Primeiro, o VAR cumpre o desígnio para o qual foi criado, independentemente de agradar a A, B ou C, depois nem sempre beneficia as melhores equipas, conforme pudemos constatar nestas imagens e iremos, com certeza, voltar a observar no futuro.

Figura 2. Análise do VAR a um golo apontado pelo Manchester City FC vs. West Ham United FC (10-ago-2019).

Num artigo científico publicado no final do mês de julho de 2019, os autores Lago-Penãs, Rey e Kalén propuseram compreender “como o VAR modifica o jogo no futebol de elite?”. Num total de 1024 jogos disputados na Série A italiana e na Bundesliga alemã, nas épocas antes e após a introdução do VAR (2016/2017 e 2017/2018, respetivamente), os investigadores analisaram os efeitos do sistema nas seguintes variáveis: faltas, golos, foras-de-jogo, penáltis, tempo de jogo na primeira parte, tempo de jogo da segunda parte, tempo de jogo total, cartões amarelos e cartões vermelhos. Curiosamente, foi identificado um decréscimo no número de foras-de-jogo, faltas e cartões amarelos após a implementação do VAR. Pelo contrário, houve um aumento do tempo de jogo na primeira parte e na totalidade do mesmo, mas não na segunda parte das partidas. Os autores concluíram que o VAR não modificou as características do jogo no futebol de elite.

Pessoalmente, sou a favor do VAR. Julgo, ainda, que são necessários mais estudos para compreender mais detalhadamente as implicações da introdução deste sistema na dinâmica do jogo. Por exemplo, na Liga NOS, considerando as médias das duas épocas prévias (2015/2016 e 2016/2017) e posteriores à introdução do VAR (2017/2018 e 2018/2019), o número de grandes penalidades por época aumentou de 95 para 106, tal como a percentagem de golos obtidos de grande penalidade por época (≈ +1.5%). Até ver, as evidências não confirmam o cenário de adversidade avançado por alguns adeptos, dirigentes e treinadores. Não obstante o aumento das paragens, o futebol tende agora a ser uma modalidade mais justa e limpa de especulações e suspeitas que somente deturpem a beleza e o significado do jogo.

Referências
Haugen, K. K. (2019). Video-Assisted Refereeing in association football: possible adverse effects on uncertainty of outcome. OA Journal – Sports, 1. doi: 10.24294/sp.v1i1.176
Lago-Peñas, C., Rey, E., & Kalén, A. (2019). How does Video Assistant Referee modify the game in elite soccer? International Journal of Performance Analysis in Sport, 19(4), 646-653. doi: 10.1080/24748668.2019.1646521