24/07/2020

Artigo do mês #7 – julho 2020 | Os jogadores ingleses não são tão maus a bater penáltis como é vulgarmente assumido

Nota prévia: O artigo científico alvo da presente síntese foi selecionado em função dos seguintes critérios: (1) publicado numa revista científica internacional com revisão de pares; (2) publicado no último trimestre; (3) associado a um tema que considere pertinente no âmbito das Ciências do Desporto.

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Autores: Brinkschulte, M., Furley, P., & Memmert, D.

País: Alemanha

Data de publicação: 27-abril-2020

Título: English football players are not as bad at kicking penalties as commonly assumed

Revista: Scientific Reports

Referência: Brinkschulte, M., Furley, P., & Memmert, D. (2020). English football players are not as bad at kicking penalties as commonly assumed. Scientific Reports, 10, 7027. https://doi.org/10.1038/s41598-020-63889-6 (link) 

 

Figura 1. Informações editoriais do artigo do mês 7 – julho de 2020.

 

Apresentação do problema

As grandes penalidades desempenham um papel importante no futebol e é plausível que assim continue a acontecer em eventos vindouros, como o campeonato europeu da UEFA, em 2021. A título de exemplo, através de desempates por grandes penalidades, já foram resolvidos 18 jogos de campeonatos europeus, incluindo um para decidir o vencedor da prova (1976). Em campeonatos do mundo da FIFA, 30 jogos foram concluídos desta forma, sendo que dois deles resultaram na consagração do campeão mundial (1994 e 2006). A investigação em torno do futebol tem sugerido, no entanto, que nem todas as nações apresentam desempenhos idênticos nestas situações, consideradas como o pináculo da performance sob alta pressão na modalidade. 

Um resultado específico que tem recebido uma extraordinária atenção do público em geral, dos média e até reconhecido por peritos de futebol em comentários televisivos, prende-se com o seguinte estereótipo: os jogadores ingleses são extremamente fracos a marcar penáltis (figura 2). 

Figura 2. David Beckham a falhar uma grande penalidade na decisão da eliminatória contra Portugal, no EURO 2004 (imagem não publicada pelos autores; fonte: uk.sports.yahoo.com)

 

Como é comum no caso dos estereótipos, há sempre alguma verdade por detrás dos mesmos. Desde 1978, a seleção nacional inglesa apenas venceu 3 dos 9 desempates por grandes penalidades em que participaram (derrotas nos campeonatos mundiais de 1990, 1998 e 2006, e nos campeonatos europeus de 1996, 2004 e 2012). Este registo negativo levou os cientistas a procurar por potenciais explicações para o facto. A chamada “maldição inglesa nos penáltis” permitiu que Jordet e colegas (2007) demonstrassem que o sucesso de uma grande penalidade, batida por um qualquer jogador, depende de uma multiplicidade de fatores psicológicos, fisiológicos, técnicos e, inclusive, da sorte. Jordet (2009a, 2009b) também evidenciou que jogadores que gozam de maior estatuto internacional, avaliado pelo número de troféus relevantes recebidos, tendem a exibir piores performances em desempates por grandes penalidades, comparativamente a jogadores com menor estatuto público. Estas evidências não sugerem que a nacionalidade dos jogadores per se influencie o resultado do penálti, ainda que a nacionalidade mesclada com variáveis de confusão (e.g., estatuto público do jogador) possa afetar o seu rendimento nestas bolas paradas. 

Esta linha de raciocínio, reforçada pela necessidade de se considerar os tamanhos das amostras na reprodutibilidade científica, levou os autores do estudo a questionar se os jogadores ingleses são, de facto, menos eficazes da marca de grande penalidade relativamente a outros de nacionalidades diferentes. Deste modo, eles procuraram solucionar o problema ao analisar a taxa de sucesso nos penáltis em função da nacionalidade do jogador. Primeiro, examinaram todas as grandes penalidades batidas em campeonatos da Europa e do Mundo (696 penáltis). Depois, investigaram uma amostra mais ampla de penáltis marcados nas principais ligas europeias (4708 penáltis). Por último, os autores consideraram esta pesquisa importante, uma vez que uma linha de investigação distinta tem destacado a influência dos estereótipos na performance desportiva, mesmo que não sejam válidos. A simples introdução de um estereótipo negativo sobre um grupo social pode, potencialmente, determinar decrementos no desempenho de membros desse grupo, fenómeno designado de ameaça do estereótipo (Beilock et al., 2013).

 

Método

Amostra: foram analisadas todas as grandes penalidades marcadas em desempates de jogos de campeonatos europeus e do mundo desde 1976 (n = 696); depois, foram também examinadas todas as grandes penalidades convertidas na principal divisão dos campeonatos nacionais da Alemanha, Inglaterra, Espanha, Itália e Holanda, desde a época 2006/2007 até à época 2015/2016. Os dados foram recolhidos de várias fontes (e.g., soccerstats.com, wikipedia.org, thestatszone.com, fifa.com, uefa.com, transfermarkt.de). 

Procedimentos: além dos nomes dos jogadores e das datas de cada penálti, os autores codificaram cada evento em função do grau de sucesso (golo vs. falhado). Os penáltis codificados foram conferidos utilizando múltiplas fontes de vídeo. Foi calculada a taxa de sucesso para cada jogador (variável dependente) e anotada a respetiva nacionalidade (variável independente). Na primeira análise – campeonatos europeus e mundiais –, houve a distinção entre performances no desempate por grandes penalidades e nos penáltis em jogo. A inferência estatística foi executada através de ANOVAs univariadas com comparações post hoc de Bonferroni. Adicionalmente, foram utilizados testes t-student para averiguar a performance dos jogadores de cada país em relação à média da amostra inteira. Perante a violação das assunções dos testes paramétricos, as alternativas não-paramétricas foram aplicadas, sendo o nível de significância adotado de 5% (p ≤ 0.05).

 

Principais resultados 

Campeonatos europeus e mundiais

Desempate por grandes penalidades: Neste tipo de grandes penalidades, um total de 387 jogadores executaram 473 penáltis. Em média, os jogadores obtiveram sucesso em 71,97% das ocasiões. Os procedimentos estatísticos não revelaram diferenças significativas em função do fator nacionalidade, embora se tenha registado um efeito de dimensão pequena. Apenas os jogadores germânicos se destacaram significativamente da média da totalidade da amostra, convertendo 85,29% das grandes penalidades. 

Penáltis em jogo: Em penáltis assinalado no decurso do jogo (tempos regulamentares e de prolongamento), 159 jogadores remataram da marca dos 11 metros. Em média, foram eficazes em 78,74% das vezes. Apesar de o efeito do fator nacionalidade não ser significativo, obteve uma dimensão de efeito pequena. Aliás, nenhum país diferiu significativamente da média da totalidade da amostra previamente reportada. 

Comparação entre desempate por grandes penalidades e penáltis em jogo: a figura 3 mostra as percentagens dos penáltis marcados em função da nacionalidade dos jogadores e do tipo de grande penalidade (desempate vs. em jogo).

 

Figura 3. Percentagens médias de penáltis marcados em campeonatos europeus e do mundo, em função da nacionalidade e do tipo de grande penalidade (desempate vs. em jogo). Os N’s referem-se aos números de jogadores de cada nacionalidade que bateram penáltis. As barras de erro representam os erros padrão da média (Brinkschulte et al., 2020).

 

Embora a figura 3 expresse algumas tendências descritivas interessantes (e.g., os jogadores ingleses tiveram um desempenho 30% menos bem conseguido nos desempates por grandes penalidades que nos penáltis em jogo; os alemães foram 10% mais eficazes nos desempates comparativamente aos penáltis em jogo), tanto o tipo de grande penalidade, como a interação entre o tipo de grande penalidade e a nacionalidade, não produziram um efeito significativo na eficácia dos pontapés da marca de grande penalidade. Por isso, os jogadores das diferentes nacionalidades analisadas não foram mais ou menos eficazes do que os outros, dependendo do tipo de grande penalidade. 

Ligas europeias

Nesta subamostra, 1103 jogadores executaram 4708 penáltis em jogo, 71,01% dos quais resultaram em golo. A figura 4 exibe as percentagens dos penáltis concretizados de acordo com a nacionalidade dos jogadores.

 

Figura 4. Percentagens médias de penáltis marcados em algumas das melhores ligas europeias, de acordo com a nacionalidade dos jogadores que os executaram. Os N’s referem-se aos números de jogadores de cada nacionalidade que bateram penáltis. As barras de erro representam os erros padrão da média (Brinkschulte et al., 2020).

 

A ANOVA univariada não revelou um efeito significativo do fator nacionalidade nas percentagens de penáltis concretizados. Contudo, a dimensão de efeito foi, mais uma vez, pequena. As comparações post hoc também não assinalaram qualquer diferença significativa entre as nacionalidades analisadas. Somente os holandeses (e quase os italianos) diferiram significativamente da média reportada para a amostra global.

 

Conclusão

Em relação ao estereótipo que os jogadores ingleses são menos eficazes da marca de grande penalidade, os resultados obtidos nesta investigação não o comprovaram. De facto, as evidências indicam que não há diferenças significativas entre jogadores de nacionalidades distintas, no que respeita às taxas de sucesso resultantes da marcação de penáltis. De um ponto de vista meramente descritivo, os jogadores ingleses foram menos eficazes em desempates por grandes penalidades (61,32%), em comparação com penáltis executados em jogo durante campeonatos europeus e do mundo (90%), e ligas europeias (75,14%). Tendo como referência a média da totalidade da amostra, os jogadores ingleses foram ligeiramente mais eficazes nos penáltis em jogo e menos eficazes no desempate por grandes penalidades (no entanto, sem diferenças significativas). 

Vieses cognitivos de diversa ordem podem levar as pessoas a exagerar determinadas perceções subjetivas, baseando-se em eventos marcantes (emocionais) que rapidamente são invocados, como a derrota num importante desempate por grandes penalidades. Este género de viés pode contribuir, de sobremaneira, para o estabelecimento do estereótipo que os jogadores ingleses são maus a bater penáltis, pois o impacto de uma derrota num campeonato europeu ou do mundo, através do desempate por grandes penalidades, é muito superior ao insucesso de um penálti em jogo. É por este motivo que as pessoas, os média e os próprios protagonistas, na generalidade, acreditam que os ingleses falham mais grandes penalidades do que realmente acontece. Eventualmente, num futuro próximo, com uma amostra mais abrangente de penalidades (desempates e jogos), é provável que este estereótipo amplamente disseminado possa até vir a desaparecer. 

 

P.S.:

1-  As ideias que constam neste texto foram originalmente escritas pelos autores do artigo e, presentemente, traduzidas para a Língua Portuguesa;

2-  Para melhor compreender as ideias acima referidas, recomenda-se a leitura integral do artigo em questão;

3-  As citações efetuadas nesta rúbrica foram utilizadas pelos autores do artigo, podendo o leitor encontrar as devidas referências na versão original publicada na revista Scientific Reports.

16/07/2020

Pontapés de canto "longos" e alternativas – motivos para diversificar

Há uns anos, em conversa com um diretor de um clube que representei, discutíamos a eficácia dos pontapés de canto. Questionou-me o porquê de treinadores optarem por pontapés de canto executados de forma “curta” (figura 1) em detrimento de “longos”, nos quais a eficácia era – presumia ele –, “muito mais elevada”. Respondi-lhe que, quando bem executado, um “canto curto” gerava dinâmicas comportamentais que promoviam incerteza nos posicionamentos ou nas marcações estipulados no método defensivo adversário, fosse o mesmo zonal, individual ou misto. Apesar disso, fui contestado, “sim, mas na maior parte das vezes resulta em contra-ataques da outra equipa”. Reiterei: “quando bem executado!”

 Figura 1. Fase inicial de um pontapé de canto “curto” bem-sucedido do Moreirense FC, na jornada 31 da Liga NOS 2019/2020 (fonte: vsports.pt).
 

Em primeira instância, do ponto de vista científico, sabemos que entre 25 e 40% dos golos concretizados no futebol de alto rendimento acontecem em esquemas táticos (bolas paradas), sendo através de pontapés de canto que a maioria é obtida (Sainz de Baranda & López-Riquelme, 2012). Contudo, convém reforçar que, em 436 pontapés de canto ocorridos em 50 jogos da FA Premier League 2011/2012, apenas 18 (4,13%) deram golo (Pulling et al., 2013). Numa análise mais abrangente de três competições de elite – Campeonato do Mundo de 2010 (FIFA), Campeonato da Europa de 2012 (UEFA) e Liga dos Campeões 2010/2011 (UEFA) –, em 1139 pontapés de canto observados de 124 jogos, 2,2% foram concluídos com êxito (Casal et al., 2015). Mais recentemente, no Campeonato do Mundo de 2018 (FIFA), foram obtidos 22 golos em 600 pontapés de canto (3,67%) (Kubayi & Larkin, 2019). Portanto, as evidências dizem-nos que, em média, 100 pontapés de canto no futebol profissional contemporâneo originam, no máximo, 4 golos. Estes dados mostram que a eficácia das equipas nestas situações fixas é tudo menos considerável. Contudo, apesar de o sucesso ser diminuto, os golos obtidos nestas circunstâncias tendem a ser fulcrais para o desfecho do jogo, uma vez que cerca de 76% determinam o empate ou a vitória da equipa concretizadora.

Em segundo lugar, embora os pontapés de canto “curtos” ou “indiretos” constituam o método ofensivo menos frequente em jogos de futebol (Sainz de Barada & López-Riquelme, 2012; Casal et al., 2015), quando aplicados, envolvem um maior número de jogadores sobre a bola e produzem percentagens mais elevadas de remates, remates à baliza e golos (Casal et al., 2015). As alterações e a confusão que induzem na organização defensiva adversária, conforme foi sugerido em alguns estudos (e.g., Borrás & Sainz de Baranda, 2005; Casal et al., 2015), levou os investigadores a considerá-los como o método ofensivo mais perigoso a utilizar neste tipo de bolas paradas. Os factos corroboram na íntegra a minha perceção na altura da conversa. 

Para atestar na prática o que foi mencionado, num jogo recente da Liga NOS (11 de julho de 2020), a equipa do Moreirense FC logrou alcançar a vitória sobre a Belenenses SAD (0-1) num lance de pontapé de canto “curto”. Aos 50 minutos, perante uma equipa anfitriã totalmente concentrada em torno da área de baliza (i.e., 10 jogadores de campo no método à zona + guarda-redes), o conjunto de Ricardo Soares foi inteligente a recorrer ao processo indireto, ao que tudo indica convenientemente preparado em treino, para desposicionar os defensores e tirar proveito dos espaços interpessoais e da incerteza criados. O cruzamento de Pedro Nuno e o cabeceamento de Nuno Santos foram exemplares.


Ainda para demonstrar que estas ideias não se esgotam atrás de um ecrã de computador, deixo claro que, na função de treinador, procuro dar muita atenção aos pormenores nos esquemas táticos. Na última época que estive em atividade, num jogo de especial importância contra uma equipa rival, não entrámos bem e sofremos o 0-1 logo aos 5 minutos. Aos 28 minutos empatámos (1-1) e, 5 minutos depois, obtivemos a vantagem no marcador, fruto de um pontapé de canto “curto”. Se as estratégias implementadas para chegar a este resultado poderão ser dissecadas num texto futuro, a premissa que norteou a execução deste método indireto foi rigorosamente a mesma do caso anterior.


Os motivos pelos quais julgo essencial diversificar os métodos ofensivos nos pontapés de canto, em particular aumentando o recurso ao “canto curto”, prendem-se com o seguinte:


· Fazer face à inferioridade numérica na área de penálti através do fator surpresa, causando incerteza entre os jogadores em processo defensivo;

· Retirar defensores de zonas vitais junto à baliza, aumentando os espaços a explorar pelos atacantes;

· Reduzir a aleatoriedade (fator sorte/azar) tantas vezes associada à marcação de pontapés de canto longos/diretos;

· Reiniciar o processo ofensivo de forma controlada, evitando perdas de bolas extemporâneas e com a equipa desequilibrada;

· Preparar a equipa em treino para situações fixas distintas, tanto do ponto de vista ofensivo, como defensivo, incrementando a criatividade dos jogadores e a capacidade do coletivo em lidar com contextos inesperados em competição;

· Uma vez que há uma massificação da observação e análise das equipas adversárias, manter os métodos ao longo da época, sem inovar, sem retificar, irá conduzir à adaptação do processo defensivo contrário e ao aumento da ineficácia ofensiva da equipa.

Concluo com algumas questões sobre as quais deveríamos refletir aquando do planeamento do microciclo semanal e das respetivas sessões de treino. Se, de facto, os esquemas táticos são uma tendência evolutiva do futebol, porque é que despendemos tão pouco tempo do microciclo a treiná-los, geralmente com um ou dois exercícios na penúltima e/ou na última sessão de treino antes do jogo competitivo (JC-2 e JC-1, respetivamente)? Mais, porque é que perdemos tanto tempo com exercícios de posse de bola, sem pressupor a obtenção do objetivo do jogo – o golo, quando podemos propor outras situações jogadas que, entre outros aspetos a desenvolver, também incluam bolas paradas? Não será a polivalência do exercício de treino uma virtude a explorar nos tempos loucos que vivemos?


Referências

Borrás, D., & Sainz de Baranda, P. (2005). Análisis del corner en función del momento del partido en el mundial de Corea y Japón 2002. Cultura, Ciencia y Deporte, 1, 87–93.

Casal, C. A., Maneiro, R., Ardá, T., Losada, J. L., & Rial, A. (2015). Analysis of corner kick success in elite football. International Journal of Performance Analysis in Sport, 15(2), 430–451. https://doi.org/10.1080/24748668.2015.11868805

Kubayi, A., & Larkin, A. (2019). Analysis of teams’ corner kicks defensive strategies at the FIFA World Cup 2018. International Journal of Performance Analysis in Sport, 19(5), 809–819. https://doi.org/10.1080/24748668.2019.1660547

Pulling, C., Robins, M., & Rixon, T. (2013). Defending corner kicks: analysis from the English Premier League. International Journal of Performance Analysis in Sport, 13(1), 135–148. https://doi.org/10.1080/24748668.2013.11868637

Sainz de Barada, P., & López-Riquelme, D. (2012). Analysis of corner kicks in relation to match status in the 2006 World Cup. European Journal of Sport Science, 12(2), 121–129. http://dx.doi.org/10.1080/17461391.2010.551418

06/07/2020

Uma breve reflexão sobre o recrutamento de treinadores para o futebol de formação na era digital

Com a preparação da nova época (2020/2021), há inúmeros clubes que já formalizaram a apresentação de treinadores/equipas técnicas e outros encetaram diligências para contratá-los. Na minha caixa de correio têm caído alguns e-mails com ofertas de trabalho para suprir lacunas em determinados escalões etários de clubes de futebol, em Portugal. São ofertas genéricas enviadas em massa para uma bolsa de treinadores, sendo a seleção dos interessados executada a posteriori. Como último recurso, nada tenho contra, embora seja recomendado a contratação de alguém que conhecemos e reconhecemos competência no seu trabalho (figura 1).

Figura 1. Recrutamento de treinadores para o futebol de formação na era digital (época 2020/2021).


Então, há uns dias, recebi um e-mail com a seguinte mensagem:

 

Oferta de Vaga - Treinador Fut. 11 - Sub.17

 

Boa tarde

O clube X está á procura de treinador para o escalão de sub 17. O cargo é remunerado. A entrevista para o cargo carece de apresentação do CV e do modelo de jogo. 

Cumprimentos,

(…)

O coordenador

 

Reparem que mantive o anonimato da entidade desportiva e do responsável para não ferir suscetibilidades. É uma mensagem perfeitamente normal, que faz alusão à remuneração (ainda há quem trabalhe a custe zero), porém, com um senão: a apresentação do modelo de jogo. Tive de ler duas vezes para, de facto, confirmar que era realidade. 

Imagine-se que sou um potencial interessado, mas não conheço o clube, a sua missão e visão, o seu plano estratégico, os seus objetivos, as características dos jovens que irão constituir o plantel, o seu passado desportivo no clube ou fora dele, a própria competição em que irão estar inseridos, como é que iria apresentar um modelo de jogo minimamente válido? 

Não serviria a entrevista inicial para avaliar a perceção do treinador acerca dos aspetos atrás referidos, dando também a entender o projeto desportivo do cube e aquilo que se pretende, em particular, para o departamento de formação? Neste primeiro momento de contacto, não seria importante conhecer em traços gerais a pessoa, a sua disponibilidade, a sua motivação e, depois, solicitar esclarecimentos sobre o seu percurso enquanto treinador, tendo por base o Curriculum Vitae? E já agora, o que se iria discutir na apresentação de um modelo de jogo fictício: posicionamentos, movimentos, métodos de jogo, esquemas táticos? Será suposto andar com um “modelo de jogo” no bolso para o caso de eu pretender voltar ao ativo? 

É impressão minha ou as prioridades no futebol de formação continuam invertidas em pleno ano de 2020?

Votos de uma boa época para todos!

24/06/2020

Artigo do mês #6 – junho 2020 | Tomada de decisão em treino no futebol juvenil: Evidências de diversos países europeus

Nota prévia: O artigo científico alvo da presente síntese foi selecionado em função dos seguintes critérios: (1) publicado numa revista científica internacional com revisão de pares; (2) publicado no último trimestre; (3) associado a um tema que considere pertinente no âmbito das Ciências do Desporto. 

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Autores: Roca, A., & Ford, P. R.

País: Inglaterra

Título: Decision-making practice during coaching sessions in elite youth football across European countries

Revista: Science and Medicine in Football

Referência: Roca, A., & Ford, P. R. (2020). Decision-making practice during coaching sessions in elite youth football across European countries. Science and Medicine in Football. doi: 10.1080/24733938.2020.1755051 (link)

 

Figura 1. Informações editoriais do artigo do mês 6 – junho de 2020.

 

Apresentação do problema

Os investigadores na área da aprendizagem motora têm avaliado a importância da estrutura da prática na aquisição de habilidades durante o processo de treino. Este trabalho aborda uma questão crítica para treinadores e profissionais do futebol: o modo como as sessões de treino e as suas atividades devem de ser concetualizadas, no intuito de facilitar a aprendizagem e a aquisição de perícia no futebol. 

Um dos atributos que tem sido constantemente indicado para discriminar jogadores de alto nível de outros com níveis de desempenho mais baixos é a capacidade para antecipar e tomar decisões efetivas sob pressão durante o jogo. Neste sentido, o principal objetivo da atividade do treinador é promover a aquisição de competências que resultem em performances melhoradas no formato competitivo, através da prática de situações representativas que simulem as exigências desse mesmo formato (Pinder et al., 2011). A Abordagem Baseada nos Constrangimentos (Davids et al., 2008) é, neste âmbito, uma estrutura teórica relevante para concetualizar e criar ambientes de aprendizagem propícios para a aquisição de habilidades e para o transfer para a competição. Uma das estratégias mais efetivas dos treinadores passa por manipular os constrangimentos da tarefa, desenvolvendo atividades que fomentem a tomada de decisão ativa, também designadas de “atividades jogadas” (Ford et al., 2010), como os jogos reduzidos e/ou condicionados. 

O treino, em si, depende do contexto no qual estamos inseridos, pelo que é expectável que haja diferenças nas abordagens dos treinadores à prática entre países ou regiões pelo mundo fora, em parte como consequência de discrepâncias existentes na formação dos treinadores. Por exemplo, Ford et al. (2010) analisou a prática de 25 treinadores do futebol juvenil em Inglaterra e verificou que 65% das sessões de treino foram destinadas a atividades sem tomada de decisão ativa (exercícios analíticos e tarefas de condição física), ao contrário dos restantes 35%. Partington e Cushion (2013) investigaram as atividades propostas e os comportamentos de treinadores de futebol juvenil, a trabalhar numa academia de um clube da FA Premier League e comprovaram que estes agentes prescreveram mais atividades sem tomada de decisão ativa, em comparação com as atividades jogadas (53% e 47%, respetivamente). Estudos mais recentes, porém, evidenciaram que as atividades propostas em equipas de futebol juvenil em Inglaterra (Ford & Whelan, 2016) e na Austrália (O’Connor et al., 2018) envolveram uma maior quantidade de atividades em forma de jogo relativamente a situações analíticas sem tomada de decisão ativa. Estas alterações podem estar relacionadas com atualizações dos cursos de treinadores e revisões das linhas orientadoras para a aquisição de habilidades específicas do jogo nos países referidos (Ford & Whelan, 2016). 

Portanto, é necessária mais investigação que permita uma comparação direta das abordagens dos treinadores à prática, considerando uma amostra extensível a outros países para além do Reino Unido e da Austrália (figura 2). O propósito do estudo foi investigar os tipos de atividades práticas propostos por treinadores de futebol juvenil em diversos países europeus. A ideia passou por fornecer uma perspetiva global das abordagens dos treinadores à prática em algumas das nações de topo do futebol europeu. 

Figura 2. Atividades práticas propostas por treinadores de futebol juvenil: haverá diferenças entre países?(imagem não publicada pelos autores; fonte: ertheo.com)

 

Método

Amostra: 53 treinadores de futebol do género masculino, a trabalhar com jovens dos Sub-12 aos Sub-16, em 16 academias de clubes profissionais de futebol em 4 países europeus: Inglaterra – 10 treinadores com certificação UEFA B e 5 UEFA A; Alemanha – 8 UEFA B, 4UEFA e 2 UEFA Pro; A; Portugal – 6 UEFA B e 5 UEFA A; Espanha – 6 UEFA B, 5 UEFA A e 2 UEFA Pro. 

Procedimentos: foram examinadas 83 sessões de treino efetuadas nas academias de cada clube, num total de 20 sessões para os 4 clubes ingleses, 21 sessões para os 4 clubes alemães, 22 sessões para os 4 clubes portugueses e 20 sessões para os 4 clubes espanhóis. Um sistema de anotação manual foi utilizado in situ para recolher os dados de cada sessão (i.e., variáveis contextuais, início e final das atividades implementadas pelos treinadores e períodos de transição). O sistema de categorização das atividades encontra-se especificado na tabela 1.


Tabela 1. Categorias e definições das atividades relacionadas com a prática de futebol utilizadas na análise (adaptado de Roca & Ford, 2020).

Fiabilidade intra e inter-observador: 9 sessões aleatórias foram codificadas in situ, em duas ocasiões distintas separadas por uma semana de intervalo para o principal observador (intra-observador) e recorrendo a outro treinador de futebol (UEFA B) no decurso de uma semana (inter-observador). A percentagem de acordos foi 98.5% para o teste intra-observador e 96.3% para o teste inter-observador. 

Análise de dados: como as sessões variaram em duração, foram calculadas as percentagens de tempo passado nas atividades principais (e respetivas categorias) e nos períodos de transição. A comparação dos resultados foi executada pelo cálculo da estatística descritiva (média ± desvio-padrão) e pela aplicação de ANOVAs unifatoriais, com o método de correção de Bonferroni (post hoc) para comparações de pares. O nível de significância adotado foi de 5% (p < 0.05).

 

Principais resultados

Conforme podemos observar na figura 3, a percentagem de tempo passado em atividades com tomada de decisão ativa foi 62 ± 9% (média ± desvio-padrão), enquanto que para as atividades sem tomada de decisão ativa foi 20 ± 8%, com a percentagem remanescente (17 ± 3%) destinada a transições.

 

Figura 3. Percentagem média (desvio-padrão) da duração das sessões passada em atividades com tomada de decisão ativa (verde), sem tomada de decisão ativa (vermelho) e em transições (cinzento), em função do país analisado. (diferenças significativas: *p <.01 e **p <.001)

 

Atividades com tomada de decisão ativa

As percentagens de tempo das sessões passado em situações de jogo reduzido/condicionado foram entre 5 e 13% superiores nas equipas jovens portuguesas e espanholas, em relação ao observado para as equipas inglesas e alemãs (tabela 2). Nas outras categorias as percentagens foram similares, variando entre 7 e 11% para as habilidades (ativas), entre 5 e 8% para os jogos unidirecionais, entre 8 e 13% para os jogos de posse de bola e entre 1 e 5% para os jogos de fase.


Tabela 2. Percentagem média (± desvio-padrão) de tempo passado nas subactividades com e sem tomada de decisão ativa, em função do país. 


Atividades sem tomada de decisão ativa

A tabela anterior demonstra que a percentagem de tempo despendido em atividades de fitness para as equipas jovens alemãs foi entre 10 e 14% superior ao registado para as equipas inglesas, portuguesas e espanholas. Por sua vez, as equipas inglesas tiveram uma percentagem de tempo destinado ao treino técnico superior, entre 11 e 16%, comparativamente às equipas alemãs, portuguesas e espanholas. Por último, as percentagens de tempo associado a habilidades (não ativas) foram reduzidas, variando entre os 2 e os 5% para as equipas das 16 academias dos 4 países.

 

Conclusão

Este foi o primeiro estudo que procurou comparar a microestrutura das atividades propostas por treinadores de academias de clubes profissionais em países distintos. Houve diferenças significativas entre os países na quantidade de atividades propostas com e sem tomada de decisão ativa. Os jovens jogadores portugueses e espanhóis passaram mais tempo em atividades com tomada de decisão ativa, em especial em jogos reduzidos/condicionados, relativamente aos jovens ingleses e alemães. Este tipo de atividades proporciona mais oportunidades para desenvolver habilidades percetivas, cognitivas e motoras em contextos que, também, fomentam o transfer para a competição. Ao invés, os jovens ingleses e alemães passaram mais tempo em atividades sem tomada de decisão ativa, nomeadamente, em treino técnico nas academias britânicas e em exercícios de fitness nas germânicas. A sobreutilização desta tipologia de atividades está comprovada como sendo menos efetiva para a aprendizagem do jogo e para o transfer positivo de competências ligadas à tomada de decisão do contexto de prática para o competitivo.

 

Implicações práticas

Recomenda-se que os treinadores proponham mais situações representativas do jogo de futebol (e.g., jogos com regras adaptadas) durante as sessões de treino, fomentando o aumento do tempo útil de prática com atividade decisional. Como o tempo passado em transições foi cerca de 20% da duração total das sessões em todos os países analisados, os treinadores também se devem preocupar em ser mais efetivos e céleres nestes momentos, por forma a aumentar o tempo útil passado em tarefas práticas. Em linha com outras evidências científicas nas áreas da aprendizagem motora e do desenvolvimento da perícia no desporto, a exposição dos jovens jogadores a uma maior quantidade de atividades com tomada de decisão ativa favorece a transferência de competências específicas para o jogo competitivo.

 


P.S.:

1-  As ideias que constam neste texto foram originalmente escritas pelos autores do artigo e, presentemente, traduzidas para a Língua Portuguesa;

2-  Para melhor compreender as ideias acima referidas, recomenda-se a leitura integral do artigo em questão;

3-  As citações efetuadas nesta rúbrica foram utilizadas pelos autores do artigo, podendo o leitor encontrar as devidas referências na versão original publicada na revista Science and Medicine in Football.

10/06/2020

A tomada de decisão no futebol, segundo o professor Duarte Araújo

No passado dia 20 de maio de 2020 tive a oportunidade de rever (virtualmente) o professor Duarte Araújo, convidado para uma conversa online na página do Facebook da Sapienta Sports. De entre as inúmeras formações e conversas à distância que segui, foi, sem margem para dúvida, uma das mais proveitosas dos tempos de confinamento. A temática da conversa esteve associada à principal área de investigação do professor – a tomada de decisão –, com especial incidência na modalidade futebol.

Conforme foi cabalmente esclarecido, a expressão “tomada de decisão” remete-nos para um conceito estático, decorrente do paradigma cognitivista ou mecanicista, que concebe o movimento humano em três etapas sucessivas: 1) captação dos estímulos informacionais pelos sentidos, 2) processamento da informação e decisão da resposta e 3) execução da resposta pelos órgãos efetores (no caso, os músculos). Porém, a teoria do processamento informacional tem sido descartada na área do desporto em prol de uma perspetiva mais ecológica, que equaciona o contexto como um parceiro contínuo e indispensável na seleção das ações que realizamos ou não. Os acoplamentos perceção-ação ajudam a entender o cariz imediato do comportamento humano em contextos de elevada variabilidade e imprevisibilidade, nos quais emergem inúmeras oportunidades de ação, as designadas affordances. Cada affordance é, por isso, circunstancial e reúne condições espaciotemporais muito particulares, que resultam das forças (equipas) em confronto.

Neste sentido, se o objetivo do treino é afinar ou calibrar a perceção de oportunidades de ação acoplada à execução de ações motoras apropriadas, tendo em consideração as capacidades individuais do jogador, não será algo paradoxal continuarmos a falar em “tomada de decisão”? De acordo com o professor Duarte, temos falta de vocabulário na Língua Portuguesa. Os britânicos usam o termo agency, uma espécie de inteligência, ou influência, que dirige a busca por determinadas affordances. A expressão “tomada de decisão”, ainda que mecanicista e estática, não deixa de fazer algum nexo, pois se há affordances sobre as quais o jogador atua, há outras que declina. Estas affordances são meras solicitações, circunstanciais como já referimos, que o indivíduo pode aceder ou não. O propósito do treino é desenvolver a modulação de affordances e dos ciclos contínuos de perceção-ação.

Depois temos de considerar a intenção, um aspeto fulcral em tudo aquilo que fazemos. A intencionalidade no futebol, ou em qualquer outro jogo desportivo, direciona os acoplamentos perceção-ação num determinado sentido. A intenção, per se, não determina o comportamento, porque deve ser convergente com o objetivo da tarefa. Por exemplo, ultrapassar um adversário numa situação um contra um (1v1) não é um fim em si mesmo; o portador da bola dribla o defensor para se aproximar da baliza, criar uma situação de finalização e, eventualmente, marcar golo. Neste contexto é fundamental reportarmo-nos à Abordagem Baseada nos Constrangimentos, inicialmente proposta por Karl Newell (1986), entretanto já aprimorada por outros autores, incluindo o professor Duarte Araújo (Figura 1).

Figura 1. O papel do acoplamento informação-movimento como base para o desempenho competente e para a aquisição de perícia no desporto (Chow, Shuttleworth, Davids, & Araújo, 2019).

As ações específicas do jogo resultam da interação permanente entre três tipos de constrangimentos: do indivíduo (características do jogador), da tarefa (i.e., exercício analítico, forma jogada ou jogo) e do ambiente (envolvimento). Desta interação gera-se um continuum de fontes de informação e comportamentos associados que desencadeiam os ciclos de affordances. À medida que o jogador se torna mais proficiente, desenvolve um acoplamento mais forte e estreito entre a informação existente num dado contexto e as ações que é capaz de executar. Quando treinadores questionam tão frequentemente a relevância destas estruturas teóricas para a prática, não posso deixar de me insurgir. Construtos teóricos de qualidade estarão sempre na base de uma prática lógica, válida e direcionada para o êxito. Permitam-me uma pergunta estapafúrdia: em contexto de ensino do futebol, será razoável colocar crianças Sub-7 a praticar 11v11? A maioria dirá logo que não. É evidente, uma vez que as fontes de informação determinadas pela complexidade da tarefa não estão adequadas às características dos praticantes no envolvimento em causa. O caos ocasionado pela tarefa não será devidamente resolvido pelos miúdos, ou seja, não serão bem-sucedidos. Conciliar estruturas teóricas de qualidade com estratégias e metodologias efetivas na prática aproxima-nos da concretização dos objetivos estabelecidos, sejam eles de caráter vincadamente pedagógico ou estritamente competitivo.

Achei especialmente feliz o exemplo que o professor concedeu a propósito do ex-treinador de basquetebol (e também professor) Jorge Araújo, que afirmava que não podia preparar a sua equipa para as competições europeias de igual forma ao que fazia para as competições nacionais. Tinha de promover o aumento do ritmo de jogo, proporcionando maiores restrições espaciotemporais e, com esse intento em mente, colocava a equipa a treinar situações de jogo 5v7 ou 5v8. Por inerência, entramos no conceito de “representatividade da tarefa”, que não tem apenas que ver com as características genéricas do exercício ou com o imitar o jogo em termos de componentes estruturais (tempo, espaço, número, regras, etc.). Na prática, o que importa é que os treinadores sejam capazes de refinar as funções dos jogadores, mantendo fontes de informações que estes podem usar em competição e com o seu próprio modo de ação.

Finalmente, as relações interpessoais subjacentes à configuração de uma equipa devem alicerçar-se em três pilares fundamentais que, além de coexistirem, sustentam todo o processo de performance no futebol, em particular, e nos jogos desportivos coletivos, em geral: estrutura, função e dinâmica (figura 2).

Figura 2. Componentes fundamentais para o desempenho da equipa.

Em suma, foram 60 minutos com muito "sumo" gratuito, contudo, como tudo nesta vida, cada um bebe o que quiser.


Referências

Chow, J. Y., Shuttleworth, R., Davids, K., & Araújo, D. (2019). Ecological dynamics and transfer from practice to performance in sports. In N. J. Hodges & A. M. Williams (Eds.), Skill acquisition in sport: Research, theory and practice (3rd Edition). Abingdon, Oxon: Routledge, Taylor & Francis Group.

Newell K. M. (1986). Constraints on the development of coordination. In M. G. Wade & H. T. A. Whiting (Eds.), Motor development in children: Aspects of coordination and control (pp. 341–360). Dordrecht: Martinus Nijhoff.