10/02/2013

Análise do jogo "in loco" pelo treinador: O caso Toni


O português Toni, desde que emigrou para o Irão para treinar os vice-campeões do Tractor, tem tido uns comportamentos, no mínimo, bizarros. Não sei se é do ambiente que por lá se vive, se a derrota é punida com pena de morte, mas não me lembro de tais descontrolos emocionais em Portugal.
 
Há uns meses perdeu as estribeiras numa conferência de imprensa. Há dois dias atirou-se literalmente para o tartan, no decurso de um jogo em que estava a vencer por 1-0, e na sequência do que aparenta ser uma péssima decisão de um dos seus jogadores (para ver o vídeo, clique aqui).
 
Foto: Toni foi ao tartan num jogo do Tractor. (fonte: www.abola.pt).

Não é por acaso que se costuma referir que a emoção é a inimiga da razão. Qualquer ser humano não está imune a descontrolos emocionais e temos diversos exemplos do português mais conceituado José Mourinho. Contudo, a questão que se coloca é: não será a vivência dos jogos, com os “nervos à flor da pele”, um fator negativo para a observação, a análise e a resposta do treinador em pleno jogo?
 
Quem assume ou já se assumiu as funções de treinador em situação de competição sabe que é bem possível que isso seja prejudicial para os seus próprios julgamentos, tomadas de decisão e feedbacks. Do mesmo modo que o treinador, no pós-jogo imediato, esquece inúmeros acontecimentos relevantes que ocorrem numa partida, também há muitos detalhes que passam impercetíveis quando se deixa governar pela emoção. Naturalmente, a informação disponível para formular decisões não é tão precisa, o que condiciona negativamente a resposta, seja de que índole for (feedback, substituição de jogadores, alteração estratégico-tática, etc.).
 
Daí que seja conveniente ter sempre por perto e comunicar com um ou mais elementos (normalmente, treinadores adjuntos) capazes de efetuar uma análise do jogo “in loco” assente na razão e, portanto, estando libertos da parcialidade e do foco de distração que é o funcionamento exacerbado dos centros emocionais. O alto rendimento assim o exige e, mesmo perante a existência de planos de jogo em que sejam equacionados e previstos determinados episódios no desafio, o treinador terá, em última instância, de selecionar aquela que pensa ser a melhor resposta para concretizar os objetivos da equipa.
 
Atirar-se para o chão, vociferar impropérios, gesticular desalmadamente e rogar pragas aos sete ventos não é solução.

Calma, Toni!

10/01/2013

A jogada do momento... protagonizada por miúdos

Circula pela internet um vídeo de uns miúdos gregos a marcarem um golo, após uma sequência de 20 passes consecutivos. Por esta altura, não deve ser novidade para ninguém. As imagens são estas:
 


Numa breve pesquisa consegui perceber que se trata da equipa de Infantis (Sub-13) do AO Giannina; no jogo em causa, venceu a formação congénere do Atromitos por 6-1. Trabalho com miúdos do escalão Sub-13 há sete épocas e posso assegurar que não é nada comum assistir a um processo ofensivo tão bem construído e finalizado, coletivamente, nestas idades. Além disso, por não se tratar de uma equipa pertencente a uma academia de futebol de um clube de elite, mais motivos temos para aplaudir e atribuir o mérito a quem de direito: a estes jovens jogadores e à sua equipa técnica.
 
Se não estou em erro a sequência ofensiva envolve todos os jogadores da equipa (o onze), 20 passes e 48 toques sobre a bola. A qualidade dos miúdos está patente no modo como recebem a bola, quase sempre orientando-a convenientemente para executar a ação seguinte (salvo um par de dribles e o remate, essencialmente, o passe). Nota-se uma cultura tática assinalável para o escalão etário. O cumprimento dos princípios específicos, bem como alguns gerais, é bastante evidente. Por exemplo, após o passe os jovens jogadores não descuram a cobertura ofensiva, o apoio ou a mobilidade, oferecendo, invariavelmente, solução ao portador da bola.
 
O princípio espaço é muito bem concretizado pelo lateral esquerdo aos 00:20 do vídeo; o rapaz abre uma linha de passe para o seu guarda-redes, posicionando-se praticamente em cima da linha de fundo. Quantos praticantes federados de futebol, com 12-13 anos, fazem isto? Eu não arriscaria uma percentagem muito elevada. A saída de uma zona de pressão no corredor direito ao primeiro toque é um regalo (a partir dos 00:34), havendo logo a preocupação de mudar o lado do centro do jogo. Parece simples. Quantos miúdos deste escalão sairiam daquele enredo de jogadores ao primeiro toque?
 
Há quem relativize a jogada. Há quem faça uma analogia com a equipa principal do Barcelona FC. Depois, há ainda quem aplauda e reveja a sequência ofensiva vezes sem conta. Não é um golaço do meio-campo, ou uma bicicleta do Ibrahimovic sem preparação. É “apenas” uma grande jogada coletiva protagonizada por uma equipa infantil, de um clube grego perfeitamente desconhecido à escala internacional.
 
Só por isso, aqui fica o meu voto de louvor. Magnífico!

01/01/2013

Quando perder pode ter as suas vantagens…

Em qualquer desporto – seja ele individual, coletivo, de oposição, motorizado, etc. – ninguém gosta de perder. Nenhum atleta, técnico ou dirigente cumpre as suas funções para que a sua equipa perca em contexto competitivo. Então quando se trata de alta competição, a derrota pode ter repercussões profundas no seio de um grupo, na relação atleta-treinador e, inclusivamente, propiciar o afastamento de determinados elementos (atletas, técnicos e dirigentes) de um clube ou de uma equipa. Treina-se, compete-se para ganhar.
 
Após o mais recente desaire do Real Madrid com o Málaga, José Mourinho referiu que “faz bem perder para sabermos o que os outros sofrem”. O que se depreende das palavras do treinador português é que mesmo perante situações adversas é possível vivenciar experiências ou retirar lições que podem ser benéficas para o futuro. Estando a derrota associada ao sofrimento, Mourinho deixou uma indireta ao seu grupo e, quiçá, de forma mais específica, a alguns dos seus jogadores.
 
Foto: José Mourinho (fonte: jornaldigital.com).
 
Contudo, até para o treinador perder pode trazer as suas vantagens. Tenho para mim que é no rescaldo da derrota que o próprio trabalho, isto é, as metodologias de treino, o(s) modelo(s) de jogo e a relação e a interação com os jogadores são postos em causa. Tal não acontece quando se vence. Talvez seja consequência de alguma sobranceria, mas na vitória pouco ou nada é colocado em causa. Vencer é sinónimo de “tudo bem”. E é neste sentido que a derrota constitui um melhor estímulo para a evolução e para o crescimento do sujeito. Acredito que Mourinho e a sua equipa técnica estejam, de momento, numa fase mais vincada de introspeção, de crescimento, de evolução e de superação. Admitindo que possam não augurar benefícios de curto prazo no Real Madrid, decerto que irão recolher frutos noutras ocasiões vindouras.
 
O modo como se reflete e utiliza a informação no sentido desejado é que determina a capacidade de sairmos de uma fase negativa ou menos boa. Afinal de contas, tudo tem o seu lado positivo.

30/12/2012

De 2012, entre bolsas e valores, para 2013

2012. Um ano marcado por crises, austeridades, revoltas e fins do mundo. Ainda cá estamos, dizem os especialistas para enfrentar mais crises, austeridades, revoltas, mas sem fins do mundo. Acabaram-se as profecias maias.
 
Bolsas. Cada vez menores. Não em tecido, mas em moeda corrente. Parecem mais pesadas, porém a ilusão deriva da matéria do dinheiro. O peso é inversamente proporcional ao seu valor, daí que 2 Euros pesem mais do que 200. O engraçado da coisa é que andamos com as bolsas ou os bolsos cada vez mais pesados, embora tenhamos menor poder de compra. É a crise.

 
Valores. Uma crise que se designa por “económico-financeira”. Guardo para mim que são os valores que se enterram. Administradores de grandes empresas repartem milhões em prémios ou bonificações, resultantes de excedentes, enquanto famílias debatem-se heroicamente para poder comer. Como é um fenómeno à escala planetária, entendo que é a humanidade que está crise. Saber de enredos de senhores de poses a fazer coleções de carros de alta cilindrada, com milhares, milhões ou biliões a passar ou a morrer de fome, é algo que nos devemos de, no mínimo, envergonhar. Uns riem-se maliciosamente dos que pior ficam, uns revoltam-se, a maioria assobia para o lado.
 
2013. As expectativas pessimistas. Se o Homem sonha, a obra nasce, então se o Homem projeta pesadelos, o que de lá virá? As trevas? Há quem nos minta e refira que vai ser melhor; há quem nos queira comprar com o retorno de subsídios, que na prática não nos traz quaisquer benefícios; há quem nos coloque a mão na consciência e nos desperte para o facto de ainda podermos fazer algo por nós próprios. Que nos relembre que somos livres, não de pagar menos impostos, mas de sermos melhores para a sociedade, para uma humanidade em decadência.
 
Para todos, um magnífico 2013. Que os seus dias nos façam partilhar os valores e o bom senso, que jamais qualquer política, crise ou austeridade nos poderá retirar dos(as) bolsos(as).

09/12/2012

O Jesus da nova Era quer fazer discípulos


Ponto prévio: nada tenho contra Jorge Jesus.
 
Em tempos houve um Jesus – o Messias – que fez os seus discípulos para disseminarem a Sua palavra. Esse Jesus é figura central no Cristianismo. Atualmente, temos um outro Jesus – o Mestre da Tática, como se autoproclama – que diz que a preparação estratégica do Benfica diante do Barcelona vai fazer seguidores. Não sou eu que o digo, podemos ler aqui as palavras do mestre. Este é figura central do panorama futebolístico português.

 Foto: O mestre da tática - Jorge Jesus. Fonte: http://www.record.xl.pt

Ora, ou sou eu que sou muito limitado, porque não percebi que a equipa do Barcelona manteve a sua identidade e qualidade, ou então é o “mestre” Jesus que é um gabarola, porque aquele Barcelona esteve a anos-luz da máquina de jogar futebol que todos conhecemos. A isto não estará alheio as ausências de elementos como Iniesta, Xavi, Fàbregas, Dani Alves, Busquets, Jordi Alba, Piqué e Messi do onze inicial. Portanto, o sucesso (que é muito relativo, pois também não triunfou) que a abordagem da equipa do Benfica teve neste desafio foi extremamente influenciado pela qualidade da oposição que, quer queiramos ou não, não era o verdadeiro FC Barcelona.
 
Para além disso, o FC Barcelona já tinha o primeiro posto do grupo assegurado. Sim senhor, os milhões são importantes, mas o contexto do jogo, ao invés do que sucedeu para os jogadores benfiquistas, não constituiu um grande estímulo emocional para o coletivo “culé”. Mesmo que os jovens da cantera catalã quisessem “mostrar serviço” a Tito Vilanova, não possuem o mesmo nível competitivo de Iniesta, Xavi ou Fàbregas. Precisasse o Barcelona de vencer o jogo e estou em crer que Jesus não estaria por agora a “vender” uma abordagem estratégica como se fosse o Santo Gral. Aliás, viu-se a aflição de 10 jogadores do Benfica (excetuando o guardião Artur) a correrem atrás de Messi, quando este encetou uma das poucas tentativas de progressão com bola de que dispôs. Paremos essa jogada a meio e observemos os espaços vazios nas costas da linha defensiva encarnada. Estivessem lá os outros artistas…
 
Teve o seu mérito, mas é essencial que percebamos o contexto do jogo e esse foi, sem dúvida, determinante para a ocorrência dos eventos a que assistimos. Que o siga, quem não quis ver; que o perdoe, quem já conhece a peça.