10/04/2020

A relíquia (1887), de Eça de Queirós

“A relíquia” foi a terceira obra que li do nosso José Maria Eça de Queirós (figura 1), depois de ler lido “Os Maias” (1888) e “A cidade e as serras” (1901)”. Há muito que não constatava o brilhantismo deste escritor: literalmente, ensina-nos a escrever. Com mestria, faz uma crítica da sociedade vigente na época – já tempos de Capitalismo, conforme assinala logo no prólogo –, na qual a devoção à igreja é um imperativo para um estatuto social mais refinado.

Figura 1. Capa da recente edição de “A relíquia”, do escritor Eça de Queirós.
(obra escolhida para o 13.º Encontro do Clube de Leitura de Monchique, 9-abr-2020)

Depois, é todo um enredo de farsa, de hipocrisia e de ganância em que Teodorico – o devoto –, ou Raposão – o boémio – coabitam. Ora vivendo numa clausura eclesiástica imposta pela tia D. Maria Patrocínio das Neves, rodeada de outros tantos abutres dissimilados; ora liberto nos seus veementes impulsos mundanos, repletos de “relaxações”, como a D. Adélia, a luveira Mary e o imaginado romance com o suposto amor da sua vida: uma monja de negro em terras do Médio Oriente.

Os planos de Teodorico Raposo, contudo, deram para o torto, porque a “mentira tem perna curta”. Foi, precisamente, num momento de angústia e de penúria, que Teodorico tomou consciência dos seus atos e, quase que por ordem divina, optou por levar uma vida recatada, honesta e que o reconduziu à prosperidade. Um romance que, sobretudo, nos educa sobre a honestidade, a genuinidade e como nunca se deve deixar os nossos créditos em mãos alheias.

01/04/2020

Futebol, saudade e surpresa num exercício de treino

Após 14 anos ininterruptos ligado ao futebol de formação, no qual representei três clubes distintos como treinador – Atlético CP, JD Monchiquense e Portimonense SC –, tomei a decisão de fazer uma pausa sabática na presente época. Quis a ironia o destino que este maldito COVID-19, à data com quase 900 000 infetados e 45 000 mortos, colocasse boa parte da população portuguesa, europeia e mundial em quarentena.

O futebol que, desde cedo, fez parte da minha vida, parou totalmente. Se a saudade já apertava por não estar diretamente envolvido no fenómeno, agora, confinado entre quatro paredes, adquiriu outra magnitude. Porém, num dia de arrumações invulgares, remexendo em “águas passadas”, encontrei uma surpresa (figura 1), que me transportou para uma memória feliz do futebol: a avaliação prática das disciplinas Técnico-Tática e Metodologia do Treino, do curso de treinadores UEFA Basic (Grau II), promovido pela Associação de Futebol do Algarve, há uns anos.
  
Figura 1. O ovo contendo o “exercício-surpresa” a construir.
(clique para ampliar)

Após cada formando tirar à sorte um “exercício-surpresa”, de entre 36 hipóteses, a avaliação consistia em construir o exercício em 10 ou 15 minutos (não me recordo bem), de acordo com as breves informações facultadas e considerando o modelo de jogo previamente elaborado. O acaso ditou um exercício do Grupo 2 – Manutenção da Posse de Bola: Conceptualize um exercício de treino para a manutenção da posse da bola utilizando um espaço reduzido de jogo, e com 3 equipas.

Para além da conceção do exercício decorrer sob pressão temporal, tínhamos de equacionar todos os seus elementos, incluindo a formação das equipas, para expor, orientar e discutir em sessões práticas subsequentes. Sem margem para dúvida, foi uma das tarefas mais aliciantes do curso. Apresento em seguida a minha proposta (figura 2).

Figura 2. Representação esquemática do exercício proposto.

Características estruturais
Formato: Gr+3v3+Gr+3NT (2 neutros exteriores + 1 neutro interior)
Espaço: 25x20m (55.6 m2/jogador)
Duração: 3 x 4’ (1’ recuperação passiva entre reps)
Volume: 14’
Densidade: 1 : 1/4
Condicionantes: (1) neutros (NT) jogam, no máximo, a 2 toques/intervenção sobre a bola; (2) no processo ofensivo, é obrigatório circular a bola pelos 2 NT exteriores (linhas laterais); (3) a equipa em posse tem de realizar, no mínimo, 6 passes consecutivos para poder finalizar.
Variantes: (1) condicionar todos os jogadores a jogar, no máximo, a 2 toques/intervenção; (2) aumentar o número mínimo de passes para se poder finalizar (8-10); (3) impossibilitar a realização de passe de retorno ao último portador da bola; (4) solicitar cada NT apenas uma vez durante cada ataque.

Objetivos
(1) Potenciar o jogo apoiado, recorrendo ao triângulo como unidade estrutural funcional;
(2) Privilegiar a execução de receções orientadas e passes curtos;
(3) Estimular o cumprimento constante dos princípios específicos cobertura ofensiva e mobilidade;
(4) Em transição ofensiva, retirar rapidamente a bola de zonas de pressão adversária, variando o ângulo de ataque à baliza contrária.

Relação com o modelo de jogo
Estrutura tática de base: 1-4-3(1-2)-3. Pretendemos que a equipa jogue predominantemente em ataque posicional, fazendo do triângulo a unidade estrutural e funcional de referência. Em organização ofensiva, circular a bola com velocidade e precisão (receção orientada e passe curto), obrigando a equipa oponente a basculações sucessivas (variação do ângulo de ataque à baliza oponente). O cumprimento dos princípios cobertura ofensiva e mobilidade é essencial para circular a bola com segurança e, posteriormente, criar espaços para finalizar em golo. Em transição ofensiva, reforçar o seguinte princípio geral do modelo de jogo: «retirar a bola rapidamente da zona de pressão adversária». Após a recuperação da bola, a equipa deve circulá-la para espaços menos congestionados e mais seguros para elaborar o processo ofensivo.

Planeamento
Sessão de treino: incluir na Parte Fundamental, imediatamente após a Parte Preparatória.
Microciclo: incluir na sessão de quarta-feira, tendo jogo oficial ao domingo (-4 dias).

Zona de intensidade alvo
80-90% FC máx.; PSE: 8/9.

Regime
Força específica.

Equipas

O melhor, no entanto, foi a camaradagem, a partilha de conhecimentos e experiências, e aquele cheiro tão característico da relva. O futebol, a saudade e a surpresa imiscuídos num simples exercício… para a posterioridade.

Para todos os meus companheiros de curso e formadores: um abraço e votos de saúde e muito sucesso!

20/03/2020

Artigo do mês #3 – março 2020 | Treinar com inteligência, jogar mais: Perspetivas sobre preparação e participação em jogo numa seleção nacional jovem

Nota prévia: O artigo científico alvo da presente síntese foi selecionado em função dos seguintes critérios: (1) publicado numa revista científica internacional com revisão de pares; (2) publicado no último trimestre; (3) associado a um tema que considere pertinente no âmbito das Ciências do Desporto.

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Autores: Jorge Arede, António Paulo Ferreira, Pedro Esteves, Oliver Gonzalo-Skok, & Nuno Leite
Título: Train smarter, play more: insights about preparation and game participation in youth national team
Revista: Research Quarterly for Exercise and Sport
País: Portugal
Referência:
Arede, J., Ferreira, A. P., Esteves, P., Gonzalo-Skok, O., & Leite, N. (2020). Train smarter, play more: insights about preparation and game participation in youth national team. Research Quarterly for Exercise and Sport. doi: 10.1080/02701367.2019.1693012 (link)

Figura 1. Informações editoriais do artigo do mês #3 - março 2020.

Apresentação do problema
No basquetebol, tal como noutros jogos desportivos coletivos, a preparação para uma competição internacional ocorre em períodos temporais limitados e, geralmente, com um calendário de treinos e jogos bastante concentrado. Neste quadro de constrangimentos, é fundamental selecionar os jogadores mais capazes para preparar os jogos competitivos, com o objetivo de se alcançar o melhor resultado possível. A análise da relação entre a preparação física e os desempenhos em treino e jogo, para predizer a prontidão dos jogadores para treinar e competir, é uma tarefa absolutamente indispensável para o corpo técnico. Embora o tópico tenha sido já investigado em contexto de clube, ao nível de seleções nacionais, a literatura ainda é escassa.

Diversos estudos têm demonstrado que o desempenho físico (e.g., distância percorrida) e a performance técnica (e.g., lançamentos/remates) estão associados ao resultado do jogo. Adicionalmente, evidências prévias mostraram que a preparação envolvendo o sistema cardiorrespiratório e a produção de força pelos membros inferiores influenciam a capacidade de trabalho de alta intensidade que replica a natureza intermitente dos desportos de equipa. Contudo, há ainda alguns resultados contrastantes, indicando, por exemplo, uma fraca associação entre a carga de treino e o desempenho em competição (Gastin et al., 2013).

Portanto, a inexistência de estudos científicos a explorar a relação entre exigências do treino e as exigências do jogo, ao nível das seleções nacionais, faz como que haja um caminho a percorrer no sentido de auxiliar as equipas técnicas a melhorar, por um lado, a seleção dos jogadores e, por outro lado, a própria planificação do processo de treino para as competições internacionais. Os objetivos da presente investigação foram: (i) examinar a relação entre a preparação física e os padrões de atividade, bem como as respostas percetivas durante sessões de treino (n = 19) e jogos particulares/amigáveis (n = 3); e (ii) identificar quais as exigências de movimento e as respostas percetivas das sessões de treino e dos jogos particulares que melhor predizem o estatuto dos jogadores (titular vs. não titular), durante um Campeonato Europeu Sub-16 da FIBA.

Métodos
Amostra: 12 jogadores de basquetebol (idade = 16.02 ± 0.40 anos) selecionados para a seleção nacional de Portugal Sub-16, de forma a participar num estágio de preparação (julho de 2018) para o Campeonato Europeu da categoria.

Procedimentos de recolha de dados: Os dados foram recolhidos no decurso de 19 sessões de treino e 3 jogos particulares (figura 2). A preparação física foi avaliada 3 semanas antes do estágio da seleção nacional num campo de basquetebol indoor (pavilhão desportivo). As variáveis de movimento foram captadas por meio do sistema WIMU PRO (Realtrack Systems, Almeria, Spain). Após o Campeonato Europeu, os jogadores foram divididos em duas categorias – titulares e não titulares –, com base no estatuto evidenciado e nos minutos de jogo acumulados durante a competição.
Figura 2. Cronologia da recolha de dados (Arede et al., 2020).

Variáveis do estudo: A variável dependente do estudo foi o estatuto dos jogadores. As variáveis independentes foram dividas em preparação física (teste intermitente de recuperação Yo Yo – nível 1; salto com contramovimento; teste de agilidade “T”; índice de assimetria dos membros inferiores), exigências de movimento (distância percorrida; acelerações de alta intensidade; desacelerações de alta intensidade; número de impactos corporais; carga individual de treino; pico de velocidade; pico de aceleração; pico de desaceleração), resposta percetiva ao esforço (escala de Borg CR10), dor muscular (Visual Analogue Scale) e estatísticas específicas de jogo (minutos; pontos; assistências; roubos de bola; blocos; ressaltos; eficiência).

Análise estatística: (1) correlação de Pearson para determinar as relações entre a preparação física e as exigências de movimento em sessões de treino e em jogos particulares; (2) decisões baseadas na magnitude (dimensões de efeito) para classificar, qualitativa e quantitativamente, as diferenças entre titulares e não titulares; (3) testes t para amostras independentes para apurar diferenças entre variáveis nos dois grupos de jogadores; (4) análise discriminante para identificar as variáveis que melhor predizem o estatuto dos jogadores em competição.

Principais resultados
A análise comparativa das exigências de movimento entre sessões de treino e jogos particulares revelou correlações quase perfeitas (r = 0.99) nas variáveis distância percorrida, acelerações de alta intensidade, desacelerações de alta intensidade, impactos corporais e carga individual de treino.

Os não titulares realizaram melhores performances no teste intermitente de recuperação Yo Yo – nível 1 e no teste de agilidade “T”, enquanto os titulares apresentaram menor assimetria nos membros inferiores e melhor desempenho no salto com contramovimento. À exceção da dor muscular pós treino, os jogadores não titulares obtiveram valores mais elevados nas atividades de movimento e nas respostas percetivas, tanto nas sessões de treino, como nos jogos particulares. Os titulares, porém, foram melhores na maioria das estatísticas de jogo, excluindo blocos e ressaltos.

Por fim, o modelo resultante da análise discriminante identificou algumas variáveis de jogos particulares (desaceleração de alta intensidade, roubos, eficiência e minutos), a dor muscular pós treino e a altura do salto com contramovimento como sendo os fatores que diferenciaram os jogadores que atuaram mais minutos (vs. aqueles que jogaram menos), nas partidas do Campeonato Europeu da FIBA.

Implicações práticas
Ao se preparar uma competição internacional importa dispor de dados de índole diversa, que possibilitem uma avaliação holística, ou multidimensional, de todos os jogadores em observação (ou já selecionados). Neste contexto, fatores técnicos e táticos, que não aqueles estritamente associados às exigências de movimento, são cruciais para determinar o tempo de jogo competitivo individual (figura 3).


Figura 3. Seleção de Portugal em competição no Campeonato Europeu Sub-16 da FIBA, em 2018.
(fonte: Twitter da Federação Portuguesa de Basquetebol)

As estatísticas específicas obtidas em jogos particulares internacionais, designadamente as de caráter ofensivo, diferenciaram os jogadores que tiveram mais minutos no Campeonato Europeu. Possuir inteligência de jogo e capacidades percetivo-motoras mais refinadas são plausíveis para explicar o facto de jogadores mais utilizados não terem a necessidade de percorrer maiores distâncias, comparativamente aos menos utilizados. Por outras palavras, os titulares são mais eficientes, o que, de forma alguma, deve ser confundido com displicência.

Os jogadores de basquetebol com maior capacidade de salto tendem a exibir habilidades ofensivas e de recuperação de posse de bola mais eficazes, embora isso também acarrete danos musculares mais pronunciados decorrentes das sessões de treino. Esta última evidência deve ser acautelada pelos treinadores no processo de preparação dos jogadores e da equipa para a competição.

Conclusão
O estatuto adquirido por jovens jogadores de basquetebol no Campeonato Europeu de Sub-16 foi influenciado por diversos indicadores recolhidos em fases distintas de preparação para a competição. Algumas variáveis afetas à performance em jogos particulares internacionais, a dor muscular pós treino e a altura de salto com contramovimento discriminaram os titulares dos não titulares no evento. Desta maneira, os indivíduos que saltam mais alto, que apresentam melhores estatísticas e mais minutos em jogos particulares podem ter uma probabilidade mais elevada de ser titulares no Campeonato Europeu, ainda que fiquem aquém dos não titulares nas exigências de movimento manifestadas em treino e em jogos de preparação.


P.S.:
1-  As ideias que constam neste texto foram originalmente escritas pelos autores do artigo e, presentemente, traduzidas para a Língua Portuguesa;
2-  A leitura deste texto não dispensa a leitura integral do artigo em questão;
3-  As citações efetuadas nesta rúbrica foram utilizadas pelos autores do artigo, podendo o leitor encontrar as devidas referências na versão original publicada no Research Quarterly for Exercise and Sport.

07/03/2020

International Journal of Performance Analysis in Sport (Vol. 20/2020) | Análise dos cabeceamentos no futebol de alto rendimento: evidências da Premier League inglesa

Corria o ano de 2019 quando fui convidado pela professora Anna Volossovitch, da Faculdade de Motricidade Humana – Universidade de Lisboa, para fazer a validação por peritagem de um sistema de observação e análise de cabeceamentos no futebol. A tarefa, integrante do projeto da tese de doutoramento do treinador finlandês Jani Sarajärvi, foi cumprida com entusiasmo.

Passados alguns meses, recebi novo contacto para colaborar no primeiro artigo do projeto – Analysis of headers in high-performance football: evidence from the English Premier League –, visando a submissão numa revista científica internacional. Escusado será dizer que o grosso do trabalho já estava executado, mas tentei contribuir da melhor forma possível para que o intento fosse bem-sucedido. Apesar da minha modesta participação, e volvidos os habituais meses de revisões para cá e para lá, recebemos a boa nova da publicação no International Journal of Performance Analysis in Sport, no passado dia 4 de março de 2020 (figura 1).

Figura 1. Cabeçalho, título e autores do artigo.

Em traços gerais, o estudo objetivou reunir informação sobre as situações de jogo em que os cabeceamentos são executados no futebol de alto rendimento, no caso, na FA Premier League. Além disso, também acumulou o propósito de caracterizar como é que os cabeceamentos são executados em diferentes situações de jogo (figura 2). Sem detalhar as inúmeras relações que foram avaliadas entre as variáveis propostas na investigação, a simples análise da distribuição de frequências demonstrou que (1) a maioria dos cabeceamentos levou à perda da posse de bola, (2) quase metade foram executados em situações de bola parada, especialmente, em pontapés de baliza e lançamentos laterais e (3) uma quantidade substancial de cabeceamentos foi executada para prevenir o avanço espacial da equipa adversária, aquando da realização de ataques rápidos ou contra-ataques recorrendo a passes longos.
Figura 2. Ação do cabeceamento no futebol (fonte: worldfootball.net).

Embora os cabeceamentos e os duelos aéreos sejam ações frequentes no jogo de futebol, e os jogadores devam ser preparados para lidar, eficazmente, com esses contextos, a questão mais imediata que se coloca aos treinadores é a seguinte: será que vale a pena privilegiar a adoção de métodos ou estilos de jogo que impliquem que a bola esteja constantemente em trajetória aérea?

Para os mais interessados na matéria, recomendo a leitura do artigo na sua totalidade. Entretanto, deixo o resumo original:

Abstract
This study aimed to gather information about game situations where headers in high-performance football were performed and to characterise how headers were executed in different game situations. A multidimensional observational system was designed to characterise the header situation and technical execution. A sample of 920 headers were randomly collected from the English Premier League 2017–2018 season, using InStat Scout® website platform. Frequency analysis of headers showed that (1) most led to ball losses; (2) almost half was performed during set plays, especially in goal kicks and throw-ins; (3) a substantial amount was executed to prevent spatial progress of opponents when employing direct attacks with long passes. Chi-square analyses revealed significant associations (p < 0.05) between the following variables: header purpose and player position (large effect size – ES), movement and jump type (medium ES), game state and player movement, game state and jump type, space of occupation and opponent players as well as header type, header purpose and jump type, header purpose and opponent players, pass and jump type, pass and opponent players, and pass and player position (small ES). Based on the current findings, coaches are strongly encouraged to design representative training environments for headers considering position-specific needs, and to promote practice tasks and game strategies for maintaining/regaining ball possession after a player’s intentional header.

Key words: soccer; performance analysis; heading; situational variables; technical component.

Reference
Sarajärvi, J., Volossovitch, A., & Almeida, C. H. (2020). Analysis of headers in high-performance football: evidence from the English Premier League. International Journal of Performance Analysis in Sport, 20. doi: 10.1080/24748668.2020.1736409 (link)

Finalmente, tenho de destacar o enorme prazer que me suscitou colaborar com o Jani Sarajärvi e com a professora Anna Volossovitch (orientadora da tese de doutoramento) no presente trabalho, representando o Centro de Investigação em Ciências do Desporto e Educação Física (CIDEF), do ISMAT – Instituto Superior Manuel Teixeira Gomes, em Portimão.

01/03/2020

Indefinição nas missões táticas defensivas no 1-4-4-2: quem equilibra no corredor lateral?

Com o SC Braga ainda em vantagem no Funchal (0-1), diante do CS Marítimo, veio à baila a velha questão de quem equilibra defensivamente no corredor lateral quando a estrutura tática de base é o 1-4-4-2. É o avançado? É o médio interior/ala? É o médio de cobertura, vulgo “trinco”? E se não houver ninguém a aumentar a pressão defensiva, aproxima o central adjacente para efetuar cobertura defensiva ao lateral em inferioridade?

Vejamos o golo inaugural do jogo, aos 5 minutos, concretizado pelo jovem Trincão:


A equipa do Marítimo – claramente com um 1-4-4-2 definido –, face à entrada da bola no seu corredor lateral esquerdo, não fez “saltar” nenhum jogador na oposição ao portador da bola (Trincão), possibilitando à entrada do seu meio-campo defensivo uma situação de inferioridade numérica (1v2). Bem o Braga a atrair/concentrar a posição dos médios adversários no corredor central para progredir por fora (figura 1).

Figura 1. Início da situação de inferioridade numérica (1v2) do Marítimo, no seu corredor lateral esquerdo.

Com a bola descoberta, Rúben Ferreira foi recuando para temporizar e manter o setor defensivo alinhado. Ajuda? Nunca houve e Trincão – inteligente –, foi avançando para fixar os apoios de Rúben (figura 2).

Figura 2. A situação de superioridade/inferioridade manteve-se próximo da área de penálti da equipa da casa.

No momento certo, Trincão passou a bola a Ricardo Esgaio, colocando Rúben Ferreira a correr atrás do prejuízo. O problema foi que a indefinição nas missões táticas defensivas se manteve nos últimos 15 metros e, em particular, no setor defensivo insular. Como último recurso, a cobertura defensiva que era suposto ser realizada pelo central não ocorreu e a inferioridade numérica (1v2) perpetuou-se (figura 3).

Figura 3. Rúben Ferreira nas lonas, sem apoio de qualquer companheiro de equipa.

Ricardo Esgaio devolveu a Trincão que, com ângulo de remate aberto, finalizou em golo uma situação incrível de superioridade/inferioridade numérica que principiou na zona do meio-campo e teve uma duração de cerca de 8 segundos, sem qualquer ajustamento tático por parte dos jogadores do Marítimo (figura 4). Em alta competição, esta passividade é fatal.

Figura 4. Dois contra um até ao remate final (e golo) de Trincão.

É por estas e por outras que se diz, com propriedade, que a estrutura tática de base (i.e., a distribuição dos jogadores pelo terreno de jogo) não detém máxima relevância num contexto em que noção de oposição é fundamental. As dinâmicas comportamentais que se estabelecem numa equipa é que ditam se esta estará mais próxima ou distante de alcançar o sucesso. Neste âmbito, as missões táticas, a coordenação interpessoal, os ajustes e as combinações são treináveis, devendo este processo ponderar a multiplicidade de circunstâncias e problemas que o oponente pode suscitar em competição.